Folha de S. Paulo


Bônus motiva?

No mercado financeiro e em diversas outras indústrias, conforme nos aproximamos do fim do ano, começa a pressão da época dos bônus. Nesse terreno é a meritocracia que impera: quanto melhor for o seu desempenho ao longo do ano (e o do seu departamento), maior é o bônus.

A ideia é motivar os executivos a darem o seu melhor para a empresa, para poderem ganhar bônus fantásticos. Quanto maior o ganho potencial, maior o seu incentivo a trabalhar mais e melhor, certo?

Algumas pesquisas mostram, no entanto, que esse esquema nem sempre funciona —e mais, que ele pode até ser contraproducente. Até certo momento, quanto maior for o seu bônus, maior a motivação. Mas, a partir dali, um bônus potencial muito grande pode acabar se tornando uma distração e até uma fonte de stress, o que atrapalha o desempenho.

Um estudo realizado por Dan Ariely (Universidade Duke), Nina Mazar (Universidade de Toronto), Uri Gneezy (Universidade da Califórnia) e George Loewenstein (Universidade Carnegie Mellon) em vilarejos na Índia mostrou até que ponto um incentivo financeiro muito grande pode atrapalhar mais do que ajudar.

No início do estudo, os participantes sorteavam em que faixa de ganhos eles estariam. O primeiro grupo poderia ganhar o valor equivalente a um dia de trabalho, dependendo do seu desempenho, em seis tarefas que exigiam criatividade, concentração e memória. O segundo poderia ganhar o valor de duas semanas de trabalho, e o terceiro, o equivalente a seis meses de trabalho.

Os resultados foram claros: a performance do primeiro e do segundo grupos basicamente não variou, mas a pressão enfrentada pelo terceiro grupo foi tão grande que atrapalhou seu desempenho.

"Usar dinheiro para motivar pessoas pode ser uma faca de dois gumes. Para tarefas que exigem aptidões cognitivas, incentivos baseados em desempenho de baixos a moderados podem ajudar. Mas quando o nível de incentivo é grande demais, ele pode atrair tanta atenção que acaba distraindo a pessoa com pensamentos sobre a recompensa. Isso gera stress e pode reduzir o nível de desempenho", explica Ariely.

É interessante avaliar como os resultados vêm contra a nossa intuição. Ariely questionou um grupo de estudantes de MBA de Stanford e pediu para eles preverem os resultados do estudo realizado na Índia. Eles esperavam que quanto maior o bônus, melhor o desempenho, e não puderam prever o efeito negativo de um bônus muito grande no desempenho dos participantes.

Ou seja: na hora de definir a política de compensação das empresas, o departamento de recursos humanos não pode se basear apenas no instinto. Ariely sugere oferecer bônus menores e mais frequentes, mas esse é um exemplo. O que não podemos é confiar que quanto maior a motivação, melhor o desempenho —ela pode acabar atrapalhando.

Post em parceria com Carolina Ruhman Sandler, jornalista, fundadora do site Finanças Femininas e coautora do livro "Finanças femininas - Como organizar suas contas, aprender a investir e realizar seus sonhos" (Saraiva)


Endereço da página: