Folha de S. Paulo


Quando o preço dita a nossa sede

Quando você vai fazer uma compra - digamos, um smartphone novo -, não é difícil dizer que você sabe o que quer, certo? Na teoria econômica tradicional, você é um ser racional, que irá pesquisar as marcas disponíveis no mercado, comparar modelos, suas vantagens e preços, e, depois de uma análise cuidadosa, optar pelo que tem a melhor relação de custo e benefício para você.

No entanto, no campo da economia comportamental, percebemos como todo esse processo pode ser facilmente manipulado, sem sequer nos darmos conta.

No clássico exemplo de Dan Ariely, autor do best-seller "Previsivelmente Irracional", vemos como muitos de seus alunos são tentados a comprar a assinatura completa (impresso e digital) da revista The Economist" por US$ 125, frente às opções menos populares de assinatura digital por US$ 59 ou somente versão impressa por US$ 125.

Um total de 84% dos alunos preferem o combo e somente 16% optam pela assinatura digital. Comparando as três versões, fica óbvio que a completa é que mais faz sentido - quem, em sã consciência, compraria uma versão somente impressa por US$ 125, quando você pode ganhar a assinatura digital pagando o mesmo preço?

Mas se, à primeira vista, parece que a equipe comercial da revista cometeu algum erro, logo percebemos que a situação não é bem esta. Quando Ariely testa os seus alunos para ver suas preferências retirando a opção de assinatura somente impressa, um número maior de alunos (68%) vai para a assinatura digital e somente 32% citam a completa.

O resultado mostra como a forma que uma loja ou marca precifica os seus produtos afeta diretamente as nossas próprias preferências. Ou seja: é difícil tomar uma decisão de compras em termos absolutos, pois não temos uma noção de quanto algo deve custar. Nós precisamos sempre comparar e tirar conclusões com base em produtos similares - e é aí que mora a vantagem do vendedor.

Dependendo de como estiver o preço de um produto, o consumidor tira "dicas" de qual é a melhor relação entre custo e benefício, e, assim, toma a sua decisão. Quer um exemplo atual? Então pegue os preços de refrigerante que retiramos do cardápio do Mcdonalds recentemente:

300 ml: R$ 5,00
500 ml: R$ 6,00
700 ml: R$ 7,00

Você sabe quanta sede tem e quanto quer beber, não? Mas se comparar os preços, vai descobrir que o refrigerante pequeno custa R$ 1,66 por 100 ml, enquanto o médio custa R$ 1,2 por 100 ml e o grande, R$ 1,00 por 100 ml! O de 700 ml é o mais em conta - e com isso somos tentados a pedir o mais caro, sem necessariamente ter tanta sede assim.

Agora vem o mais interessante de tudo: quando comparamos estes preços com o de uma garrafa de 1,5 litro no supermercado, descobrimos como estamos pagando caro. Esta garrafa sai por R$ 4,70, ou seja, R$ 0,31! É mais barato que o refrigerante pequeno no McDonalds, por muito mais volume.

Então por que nos dispomos a comprar algo que parece valer a pena em uma situação, quando em outra ele parece claramente mais caro? É nessa hora que entra a questão relativa dos preços. Ao comparar com outros preços próximos em uma situação, você tira a sua conclusão - sem pensar no valor do produto em termos gerais. Com isto, você acaba pagando muito mais do que precisa na sua Coca-Cola, e ainda pede o tamanho grande para acompanhar as fritas e o cheeseburguer.

Escrito em colaboração com Carolina Ruhman Sandler, jornalista e fundadora do site Finanças Femininas. Estudou economia no Institut d'Études Politiques de la France, em Paris.


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