Folha de S. Paulo


Faltou empenho no fim do caso Sean

O cado de Sean Goldman tem os ingredientes para mobilizar leitores e, de fato, eles se manifestam de modo intenso a respeito do assunto.

Sob o ângulo que interessa a esta coluna, o comentário mais frequente que recebi foi o de que a cobertura da Folha teria tomado partido dos parentes da mãe brasileira em detrimento do pai, que é americano.

Não é a minha impressão. É fato que em várias edições o lado da avó brasileira apareceu com muito mais destaque do que o do pai. Mas, em geral, porque ele ou seus advogados preferiram não se manifestar.

Isso não exime o jornal do dever de verificar autonomamente se algumas das denúncias feitas pela família brasileira do menino tinham algum fundamento, como a de que a decisão do presidente do STF que o devolveu ao pai fora motivada pela possibilidade de o Congresso dos EUA cancelar vantagens comerciais usufruídas pelo Brasil.

Aliás, é curioso observar como a publicação de uma acusação grave feita não pela reportagem, mas por uma fonte independente às vezes provoca comoção coletiva e às vezes cai em total indiferença. Nenhum leitor se queixou ao ombudsman para reclamar de o jornal ter editado essa declaração sem apurar a sua possível veracidade.

Muitas outras deficiências podem ser apontadas na maneira como o jornal tratou o caso. Uma delas foi não ter recordado agora, em seu desfecho, que a Folha, o primeiro veículo a divulgar a história (em 16 de setembro de 2008), foi vítima de censura judicial e não pôde voltar a ele por muitos meses porque a Justiça do Rio assim o determinou.

Aqui, também, é interessante observar os dois pesos e duas medidas por parte de leitores. Muitos se pronunciam desde que há mais de cinco meses a Justiça impôs censura a um concorrente em caso que envolve o filho do presidente do Senado, José Sarney, pedindo que este jornal se empenhe mais em protestar contra ela; nenhum se dirigiu a mim para condenar a censura no caso Sean Goldman.

Outra lacuna foi não ter examinado criticamente o evidente assalto à intimidade do garoto cometido pela mídia em geral no Brasil e nos EUA. Com exceção da coluna de São Paulo da página A2 de domingo passado, não houve a indispensável autoanálise sobre o comportamento jornalístico no caso.

Acho que é impossível para um veículo de comunicação não noticiar episódios como este, ainda mais porque os principais envolvidos (as duas famílias) não tiveram constrangimento em usar a mídia para se beneficiar na batalha judicial.

Mas creio que mais cuidados (além de borrar o rosto do garoto nas fotos publicadas) poderiam ter sido tomados para preservar sua privacidade.

Em geral, a cobertura foi reativa e preguiçosa. Registrou as declarações, tentou ouvir todos os lados, reportou os fatos públicos. Mas não foi crítica, não se esforçou em obter informações que não estivessem à disposição, deixou de abrir o leque (por exemplo, mostrando os casos de crianças brasileiras sequestradas por um dos pais e no exterior à espera de decisões judiciais para poderem retornar ao país).

Após ter dado o furo e sido proibida por muito tempo de tratar do assunto, a Folha deveria ter se empenhado mais ao seu final.


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