Folha de S. Paulo


O que faz o eleitor decidir o voto

"Ao longo da campanha eleitoral, a maioria das mensagens que recebi sobre a cobertura deste jornal a acusava de ser tendenciosa."

Assim começa a coluna do dia 19 de outubro do ombudsman do "New York Times" sobre a eleição presidencial americana de 2008.

Clark Hoyt relata que muitas das acusações denunciavam o jornal por operar agenda política consciente para ajudar um candidato e destruir o outro.

Parece que os ombudsmans estão fadados a ter o mesmo tipo de problema, não importa em que país trabalhem.

Ao contrário do Brasil, nos EUA há uma longa e bem estabelecida história de pesquisas científicas sobre a influência que os meios de comunicação exercem sobre o comportamento do eleitor.

Ela teve início da década de 1930, quando se costumava atribuir ao emprego da propaganda pelo rádio, cinema e imprensa a maior parte do sucesso de opinião pública obtido pelos nazistas na Alemanha.

Paul Lazarsfeld, cientista austríaco de inclinações socialistas e família judaica que emigrou para os EUA em 1933, onde se tornou um dos maiores sociólogos do século, foi o líder desses esforços.

Nas eleições presidenciais de 1940, 1944 e especialmente 1948, monitorou o comportamento eleitoral e de consumo de mídia dos cidadãos de uma típica cidade americana, Elmira, Nova York.

Concluiu que os meios de comunicação exerceram influência pequena ou mesmo nula sobre a decisão de voto das pessoas que constituíam seu universo de pesquisa.

Aliás, o pleito de 1948 ficou famoso porque um dos mais influentes jornais da época, o "Chicago Daily Tribune", confiou tanto nas pesquisas de intenção de voto que, em parte de sua circulação do dia seguinte, a manchete cravava vitória do republicano Thomas Dewey; o vencedor foi o democrata Harry Truman.

Nos anos 1950, Lazarsfeld iria mais longe. Com novos estudos, passou a acreditar que as escolhas eleitorais "são relativamente imunes a argumentação direta" e "caracterizam-se mais por fé do que por convicção, mais por desejo do que por cuidadosa previsão de conseqüências".

Milhares de estudos comprovaram posteriormente e até agora as descobertas de Lazarsfeld, que talvez não chegasse ao extremo de John Alford e John Hibbing, os fundadores de um provável novo campo científico, a genopolítica.

Em setembro deste ano, eles publicaram na revista "Science", uma das principais publicações acadêmicas do mundo, artigo em que mostram estudos que tentam demonstrar vínculos entre as inclinações políticas das pessoas e seus genes, entre ideologia e biologia.

Nada disso livra a mídia da responsabilidade de tentar exercer sua tarefa de noticiar os fatos políticos da maneira mais isenta e equilibrada possível. Mesmo nos EUA, onde a tradição é o veículo manifestar em editorial sua preferência a cada eleição.

Este ano, a maioria absoluta dos jornais optou por Barack Obama, considerado por quase todos os estudos já feitos sobre a cobertura eleitoral como beneficiado por um tratamento menos crítico do que o dispensado a John McCain.

Se Obama sair vencedor na terça, no entanto, sua vitória não poderá ser atribuída ao apoio explícito ou disfarçado que recebeu da mídia.

O eleitor pode não resolver seu voto por definição genética, mas tampouco o faz pelo modo como os candidatos são tratados pela mídia.


Endereço da página: