Folha de S. Paulo


Deflação + recessão=juros altos

Eduardo Anizelli/Folhapress
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, na reunião extraordinária para avaliar se mantém ou não a meta de inflação de 2018 em 4,5% e definir qual será o objetivo a ser perseguido pelo Banco Central em 2019.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn

Há um desencanto geral com a política no Brasil. A crise é tão profunda que muitas pessoas já se convenceram de que não poderemos contar com estabilidade política pelo menos até o início de 2019.

Nessas condições, ganha força a ideia de que a economia deve se desconectar ao máximo da política.

O próprio mercado financeiro dá mostras de que as bombásticas notícias na área política, envolvendo corrupção, já não têm tanto impacto nas cotações. No caso que envolveu a delação da JBS, por exemplo, houve pouca flutuação da Bolsa e do dólar.

Isso é positivo para o país neste momento. Em artigo anterior, já defendi aqui na Folha a ideia de que, mesmo na conjuntura atual de absoluta incerteza política, é possível fazer algo para atenuar a terrível recessão que colocou 14 milhões de pessoas no desemprego.

Mantenho essa ideia, mas concordo que as coisas não são tão simples. É necessário, por exemplo, sensibilidade dos parlamentares para colocar os interesses do país à frente de seus interesses pessoais.

As reformas da legislação trabalhista e da Previdência precisam ser concluídas, seja quem for o presidente da República, seja qual for o partido no poder.

Como disse o ex-ministro Antonio Delfim Netto, a reforma da Previdência não é uma questão política, é aritmética. Se não for feita, vão faltar recursos para pagar a aposentadoria das pessoas.

Negar a reforma seria como negar que 2 mais 2 são 4. A trabalhista também é essencial, porque moderniza as relações entre empregados e empregadores, o que deve ampliar e proteger os empregos formais.

A verdade é que o país não pode esperar até janeiro de 2019 para começar a pensar em crescimento econômico.

Então, além das reformas, que dependem do bom senso dos políticos, precisa de medidas de política econômica, dependentes do bom senso da equipe econômica.

Bom senso para usar os recursos públicos disponíveis para financiar investimentos básicos em infraestrutura, grandes geradores de empregos.

E bom senso para entender que a redução dos custos do crédito no país tem urgência urgentíssima.

Quando a condução econômica brasileira atual for estudada nas escolas, daqui a algumas décadas, certamente vai virar um exemplo dos mais clamorosos erros da história.

O país está em deflação (-0,23% em junho) e vive uma recessão profunda, que derruba as receitas do governo e aumenta perigosamente o deficit público. Apesar disso, a taxa básica de juros é a mais alta do mundo.

O óbvio ululante, para usar a expressão criada por Nelson Rodrigues, é que o deficit só deve diminuir quando a economia voltar a crescer, porque haverá recuperação das receitas. E esse crescimento depende, substancialmente, da queda dos juros.

Isso tudo, portanto, nada tem a ver com política. São atitudes que podem ser tomadas seja qual for o presidente ou o partido no poder. Dependem do bom senso para oferecer oxigênio aos cidadãos e às empresas.

Os cidadãos precisam de empregos para se sentir seguros e retomar o consumo, empregos que só podem vir pelo setor da infraestrutura. As empresas precisam de crédito com juros honestos para reescalonar suas dívidas e voltar a investir. E uma coisa está ligada à outra.


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