Folha de S. Paulo


O ano avança, e ainda não aparecem indicadores seguros do fim da recessão

Dá uma certa melancolia observar os dados e as projeções da economia brasileira. Sem dúvida, há alguns sinais de vida, mas nada muito convincente.

O IBGE revisou sua avaliação sobre o desempenho do comércio em janeiro: em vez de uma queda de vendas de 0,7%, como anunciara anteriormente, indicou um crescimento de 5,5%. Apesar dessa boa notícia, o setor voltou a apresentar queda (0,2%) em fevereiro em relação ao mês anterior.

O Banco Central também reviu os números de janeiro do IBC-Br, índice que busca antecipar o desempenho do PIB, e trouxe algum otimismo. De uma queda de produção de 0,26%, o índice passou para uma alta de 0,62%. Em fevereiro, o avanço foi de 1,31% ante janeiro.

A arrecadação federal, importante termômetro da economia, cresceu em janeiro e fevereiro, mas voltou a cair em março. A receita da Previdência também caiu (1,4%) no primeiro trimestre, reflexo do aumento do desemprego.

A melancolia na observação desses dados advém do fato de que eles oscilam muito de um mês para o outro. É possível que o PIB do primeiro trimestre seja ligeiramente positivo, mas as informações sobre março e abril parecem decepcionar.

Os índices de confiança da indústria, por exemplo, depois de subirem 2,9% em março, ficaram estáveis em abril, indicando que o setor está ainda em compasso de espera, a observar o imbróglio político e as reformas para tomar decisões de investimento.

O FGTS já começou a liberar recursos de contas inativas que somam R$ 43,6 bilhões, o que poderia estimular o consumo. As primeiras informações sobre o destino desses recursos, porém, indicam que no máximo 10% deles estejam sendo direcionados ao consumo das famílias, um dos propulsores do PIB.

Os sinais de recuperação, portanto, são tênues e pendulares. O ano vai avançando, já é maio, e não aparecem indicadores seguros de que o país começou a virar a página da recessão. Faltam atitudes corajosas voltadas para desenvolvimento.

Como escreveu o mestre Delfim Netto, prevalece uma visão ingênua de alguns economistas, de que o mundo é "composto por pequenas ilhas altruístas, partes de um arquipélago onde reina a paz e a tranquilidade". Nesse arquipélago, o crescimento econômico viria naturalmente, pela força do mercado.

Não é bem assim. As "ilhas", ou países, precisam lutar bravamente por seu desenvolvimento: executar políticas de estabilidade; cuidar para que a taxa de juros não inviabilize os custos de produção e para que o câmbio não seja empecilho às exportações; buscar o equilíbrio fiscal; dar estímulos anticíclicos para compensar dificuldades internas; preservar o conteúdo nacional nos grandes projetos; e zelar pelo empreendedorismo local.

Não trilhamos todos esses caminhos. A redução dos juros básicos claramente perdeu o bonde global e a taxa ainda está em 11,25%, muito defasada (acima) em relação ao nível internacional em termos nominais e reais.

Os custos elevados tornam o crédito inacessível, fontes tradicionais de financiamento estão travadas, permanece a desconfiança em relação ao quadro político, os setores público e privado contêm investimentos, o consumo patina, a empresa nacional é olhada com preconceito e prega-se a ideia de escancarar o mercado interno.

Em resumo, o país está retardando desnecessariamente sua volta ao crescimento. Isso é melancólico, para dizer o mínimo, mas o Brasil precisa reagir.


Endereço da página:

Links no texto: