Folha de S. Paulo


Discurso único do ajuste fiscal cede espaço a ações de ajuda à economia

Eloi Correa/GOVBA
Obras da Ferrovia de Integracao Oeste-Leste Cidade Tanhacu Foto: Eloi Correa/GOVBA OBRAS / PODER ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
O governo anunciou a retomada de cerca de 1.100 obras

Aquilo que a "Economist" chamou de "cataclismo", a eleição de Donald Trump para a Presidência dos EUA, pode não ser tão destruidor quanto imaginavam a revista britânica e milhões de pessoas pelo mundo. Pelo menos é o que se espera.

De qualquer forma, o surpreendente desfecho da eleição americana e outros fatos recentes, como o "brexit", deixaram uma clara mensagem: há um movimento mundial em direção ao isolacionismo, ao nacionalismo e ao protecionismo comercial.

Deixando de lado a análise do mérito dessa tendência, é forçoso reconhecer que esse movimento nos obriga a olhar com mais cuidado para o nosso próprio quintal, para o mercado interno.

Já passou da hora de pensar em medidas para estimular a volta do crescimento da economia. E, por isso, são bem-vindas algumas manifestações oficiais nesse sentido, ainda que sempre venham acompanhadas de ressalvas sobre a prioridade da adoção de ajustes fiscais para evitar o crescimento dos gastos públicos e recuperar os níveis de confiança na economia.

É consensual a ideia da importância de buscar o equilíbrio das contas públicas, porque se trata de uma condição básica, contra a qual ninguém pode se insurgir. Seria como ser contra a luz elétrica ou a água encanada.

Mas é também naturalmente óbvio que não se promove crescimento econômico apenas com discursos de austeridade voltados para a redução de despesas. É preciso pelejar por desenvolvimento, que não vem de graça, como decorrência de uma espécie de lei da gravidade.

Foi legal, portanto, ver na semana passada o presidente Michel Temer anunciar a retomada de cerca de 1.100 obras, que podem injetar R$ 2 bilhões na economia. São pequenos valores, com pequeno impacto na criação de empregos, mas a iniciativa mostra que o governo começa a romper com o discurso único e depressivo do ajuste fiscal —a predominância desse discurso vai fazer o segundo aniversário em janeiro.

Está sendo elaborada, também, uma medida provisória pela qual o governo pretende destravar concessões no setor de infraestrutura. A MP vai tentar remover problemas de concessões recentes que inviabilizaram operações, principalmente de aeroportos cedidos à iniciativa privada. Espera-se que a nova MP elimine resistências de investidores estrangeiros para participar de projetos no país. Nos últimos dois anos, a participação de empresas estrangeiras em obras de infraestrutura caiu para 30%, um nível que já atingiu 50% em períodos anteriores.

Não se faz desenvolvimento sem crédito. Ninguém pode negar que as taxas de juros brasileiras são "pornográficas" e dissociadas da realidade global. A taxa básica começou a ser reduzida, caindo de 14,25% para 14%, redução insignificante e tímida, mas positiva, porque mostra uma nova tendência.

Nessa área, do crédito, também começa a haver alguns movimentos positivos. A Caixa anunciou uma redução dos juros nos empréstimos para imóveis, tanto para compradores quanto para as empresas. Foi também uma ação tímida, com um corte de até 1,75 ponto percentual ao ano, mas no sentido correto e que pode influenciar decisões semelhantes nos bancos privados.

Falta reavivar fontes de financiamento para desenvolvimento, tanto internas, principalmente do BNDES, quanto externas.

O que pretendo observar é que pelo menos já se fala em crescimento e criação de empregos, um discurso que estava praticamente extinto na área econômica.


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