Folha de S. Paulo


Striptease ou treinamento de bombeiro?

Foi dar de cara com a inusitada dica no guia de viagens "Lonely Planet", destino Las Vegas, para saber que meu Réveillon iria adquirir um comprometimento profissional. No alto da página, lá estava a indicação, sem margem para equívoco: "Curso de iniciantes em striptease: strippers 101". Ao lado, telefone e endereço, o hotel-cassino Planet Hollywood, e a chamada: "A mais famosa aula de striptease do mundo. Instrutoras experientes, 75 minutos de aula -'pole dancing' e 'lap dancing'- para todas as idades, tamanhos e formas. Licença oficial ao final do curso".

Ilustração Alex Cerveny

A leitura em alta voz sobre os detalhes do programa que faríamos em benefício exclusivo do meu amantíssimo leitor deu ensejo a uma parada de 7 de Setembro de protestos entre minhas companheiras de viagem: "Eu não vou de jeito nenhum"; "Não trouxe roupa pra isso"; "Tem que ir de salto alto?". Ordenei que se fizesse silêncio no galinheiro e disquei o número do teatro do PH: "This is Tiffany speaking, may I help you?", atendeu a voz do outro lado. "Tiffany"? Jura? Aposto que se eu tivesse ligado para um canil, ela atenderia dizendo se chamar Rex.

Dei o número do cartão de crédito e, no dia seguinte, fomos ter com a instrutora, uma tal de Pony, numa sala que parecia uma classe de balé comum. A não ser pelas barras que, em vez de horizontais, eram numerosas, espalhadas pelo ambiente e todas na vertical.

Pony falava sem parar e mexia o rabo feito um yorkshire que foi levado para passear depois de ficar meses confinado em uma quitinete da Nestor Pestana.

A instrutora começou nos contando que todas as dançarinas de Vegas trabalham com alguma quantidade de álcool no sangue. "Não muito, só para relaxar." Depois disse que o "pole dancing" é a propaganda do negócio, serve para atrair os clientes, enquanto a "alma", o que dá dinheiro, é o "lap dancing", a modalidade em que o cliente fica sentado e a menina dança ao seu redor sem que ele possa tocá-la.

Mais dicas sobre "customer service", o "relacionamento com o cliente", tão valorizado por prestadores de serviço nos dias de hoje. A dançarina não deve "personalizar" seu striptease, sua dança, seu show. Ou seja, ela não deve dar a mínima para o homem que a está assistindo. Você faz a performance pensando em você, pensando na vida, valorizando seus próprios movimentos, focando seu condicionamento físico, utilizando qualquer objetivo que seja, menos pensar no bocó sentado à sua frente (a não ser, é claro, que ele seja seu marido e/ou namorado).

"Sabe aquele sorriso enigmático que toda stripper tem no rosto quando está dançando e olhando para o cara?", perguntou Pony retoricamente. "Pois é, ela está pensando: 'Vou tirar cada centavo deste boçal!'."

Okay, então. Hora de começar as manobras de "pole dancing". A amiga que tinha se recusado a participar do curso já estava se animando a deslizar pela haste. A julgar pela delicadeza de seus gestos e o jeito que estava trepada no poste, não há dúvida de que sempre sonhou em ser bombeiro. Eu desisti na segunda manobra, depois de ir ao chão de pernas trançadas tentando fazer um 360º em torno do cano.

Na dança da cadeira, outro fiasco da Barbarica. Suspeito ter tido um deslocamento de clavícula no movimento de tirar o sutiã e levá-lo a embrulhar a cabeça do adversário, digo, do macho, antes de estrangulá-lo e esbofeteá-lo. Parece uma sequência elementar, mas não recomendo que ninguém a repita em casa sem a supervisão da Pony.


Endereço da página: