Folha de S. Paulo


Dilema

É preciso ser míope, ingênuo ou mal informado para não reconhecer que a política monetária nunca esteve, de fato, no controle da economia americana. O Fed (o Banco Central dos EUA) assistiu, surpreso, à sua "grande moderação" terminar na "grande decepção" de 2008. Foi obra da "ciência" imaginária dos "mercados perfeitos" inventada para eliminar, em nome da "eficiência", os necessários controles sobre o sistema financeiro instalados nos anos 30 do século passado.

A verdade é que hoje, depois de 3.000 dias e US$ 3 trilhões despejados pelo Fed, pelo Banco Central Europeu e pelo Banco Central do Japão, além das ejaculações monetárias aleatórias do Banco Central chinês, o mundo continua pendurado na brocha! Não é razoável acreditar que eles tenham o "mapa" (a teoria) e a "bússola" (a experiência) para saber o que fazer: apenas apalpam às cegas, os problemas que ajudaram a criar, mas não têm como resolver.

A recente decisão do nosso Banco Central de manter a taxa Selic em 14,25% produziu um enorme ruído, apesar de ter sido, pelo menos na minha opinião, correta. Cinicamente, é melhor ser deselegante certo do que ser elegante errado. A crítica pertinente é que isso compromete a já baixa credibilidade da política econômica: Alexandre Tombini teria cedido à pressão do governo. Talvez, mas existe uma hipótese com maior probabilidade de ser a verdadeira: Tombini levou a Dilma a assustadora "visão do mundo" que começa a circular à socapa entre os agentes mais responsáveis.

Não dá mais para continuar ignorando que os problemas geopolíticos, os juros baixos e o endividamento por tanto tempo cobram o seu preço nos EUA, na Europa, no Japão e na China. Na economia não estimularam os investimentos e, consequentemente, a demanda efetiva. E na China, levaram a um superinvestimento público e privado cada vez mais insustentável. À persistente baixa inflação (nem elevá-la conseguiram!) somou-se o baixo crescimento real, o que reduziu o aumento nominal do PIB e tornou a necessária desalavancagem mais lenta e custosa.

Por fim, o enorme endividamento dos governos inibiu o investimento público e a falta de demanda efetiva reduziu o investimento do setor privado. O que estamos vendo (supervalorização dos ativos financeiros, lentidão do ajuste de preços dos alimento e minérios, queda do crescimento) é apenas a ponta de um iceberg que tem submersa a potencialidade de um desastre!

O dilema é simples: ninguém sabe se haverá a necessária acomodação geopolítica e, na economia, se haverá tempo suficiente para uma desalavancagem controlada, ou se, a qualquer momento, um evento crítico iniciará uma nova crise mundial.


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