Folha de S. Paulo


Será que vazamentos visam a manifestação de amanhã?

Rodrigo Félix Leal/Futura Press/Folhapress
Marcelo Odebrecht, preso na Lava Jato, chega ao prédio do TSE, em Curitiba, para depor em ação contra chapa Dilma-Temer, nesta sexta
Marcelo Odebrecht chega ao prédio do TSE para depor em ação contra a chapa Dilma-Temer

Sou avesso a teorias conspiratórias. Parto do princípio de que processos complexos, como os que vigoram na sociedade contemporânea, são sempre resultado de múltiplos fatores. Nenhum centro consegue controlar o conjunto deles.

No entanto, chamou-me a atenção o novo vazamento das declarações de Marcelo Odebrecht ao TSE em 1º/3 ocorrer às vésperas das manifestações programadas com o intuito de defender a Operação Lava Jato em 26/3. O estranhamento decorre de que o conteúdo principal do depoimento já havia sido divulgado, nos mesmos termos, quase um mês atrás.

Pode-se ler em "O Estado de S. Paulo" de 2/3/2017 o que Marcelo dissera ao ministro Herman Benjamin. Segundo o primeiro vazamento, Odebrecht afirmara que boa parte do doado pela empresa à chapa Dilma/Temer ocorrera por meio de caixa dois e "a petista tinha dimensão da contribuição e dos pagamentos, também feitos com recursos não registrados ao então marqueteiro do PT João Santana".

Agora, a mesma afirmação volta a ganhar enorme destaque, meramente porque a transcrição do que fora gravado em 1º/3 chegou a um site antipetista e, em seguida, a todos os grandes veículos de comunicação, no estilo do que foi apontado pela ombudsman da Folha (coletiva em off) no domingo (19). O lema jornalístico de que notícia velha não vende caiu em desuso?

Não se trata de diminuir a importância do supostamente revelado por Odebrecht. Ele fala de edição de medida provisória com expectativa de retribuição pecuniária, conversa sobre recursos com o então vice (hoje chefe de Estado), conhecimento da então presidente sobre pagamentos, para mencionar apenas alguns aspectos.

Embora não saibamos o que disso tudo está amparado por provas —sem as quais é apenas a palavra de um contra a palavra de outro—, reitero o que tenho dito e escrito: os personagens e instituições envolvidos precisam desde logo oferecer explicações detalhadas à opinião pública. Insistir no sintético bordão de que tudo foi feito dentro da lei é cada dia menos suficiente diante de relatos como o de Odebrecht. A exigência vale tanto para direita e o centro quanto, evidentemente, para a esquerda.

Compreendida a premissa acima, fica a hipótese de que o timing desses vazamentos esteja relacionado à necessidade de levar gente às ruas no domingo, como aconteceu em março de 2016 e acabou por ser decisivo para o sucesso do impeachment em abril do mesmo ano.

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Não posso deixar de registrar que a aprovação na quarta (22) de um projeto de terceirização engavetado desde 2002 escancara o forte viés antitrabalho da maioria formada para derrubar a ex-presidente Dilma Rousseff.


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