Folha de S. Paulo


Derrota da esquerda não significa avanço de valores liberais

Fabio Braga-25.set.2016/Folhapress
Sao Paulo, SP,Brasil- 25.set.2016 - Lula faz caminhada de campanha junto com Haddad no Jardim da Conquista, Sao Mateus, na zona leste. Foto: Fabio Braga/Folhapress COD 3517
Lula participa de evento da campanha de Fernando Haddad, derrotado na disputa pela Prefeitura de SP

Os resultados das eleições municipais devem ser vistos duplamente. No plano imediato, as urnas indicaram forte vitória do campo da direita e derrota da esquerda. Em chave mais profunda, contudo, isso não significa, necessariamente, igual avanço de valores liberais sobre aspirações igualitárias.

Deve-se evitar o equívoco de, sem maior reflexão, tomar a nuvem por Juno. O fato de os eleitores terem optado por determinados candidatos do PSDB e outros partidos da atual base de Michel Temer não significa a adesão ao ideário mercadista que este governo professa.

Ainda que exista, em alguma proporção, avanço das teses privatistas contra as que defendem a expansão dos direitos universais da cidadania, não parece ter sido este o móvel principal do sufrágio no último domingo. A hipótese mais provável é que o eleitorado tenha apenas chancelado a rejeição, que já se fazia notar nas pesquisas, ao que foi o último período lulista no poder. Para expressar tal sentimento era necessário votar em uma oposição nítida à ex-presidente Dilma Rousseff, condição em que o PSOL não se enquadrava.

As razões são fáceis de compreender. A brutal recessão, com perda de emprego e renda, que começa no segundo mandato de Dilma já seria razão suficiente para explicar o descenso do PT. No entanto, se somou um megaprocesso de investigação criminal (Lava Jato), cujos efeitos seletivos se centraram sobre o partido no poder até seis meses atrás.

Diante do tsunami desencadeado pela soma explosiva dos dois fatores acima, o maior trunfo do PT foi ter sobrevivido. Perdeu metade do que obteve em 2012, com danos significativos na região metropolitana de São Paulo, cinturão histórico da legenda, mas ainda respira. O PSOL, embora vitimado pela vontade geral de punir a esquerda, conseguiu, por meio das candidaturas de Marcelo Freixo, no Rio, e Edmilson Rodrigues, em Belém, presença inédita na cena nacional.

Na esfera do curto prazo, a população espera que os novos governantes sejam capazes de melhorar as condições de vida. Geraldo Alckmin, sem dúvida o político individual mais beneficiado pelo conjunto de decisões que os votantes produziram, precisa que os seus representantes, João Doria em particular, apresentem logo resultados palpáveis. O governador paulista deve rezar para que a economia reaja, o que até agora não aconteceu.

Numa perspectiva de longo prazo, a expansão do pensamento capitalista, de que certas confissões evangélicas são veículo importante, poderá vir a predominar, produzindo um realinhamento conservador no futuro. Por ora, soa mais provável entrarmos num período de desalinhamento. A depender, também, de como a esquerda reaja ao banho que acaba de levar.


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