Folha de S. Paulo


De olhos postos na Grécia

As eleições que ocorrem amanhã na região que inventou a democracia antiga tem o potencial de representar a maior novidade política desde a crise econômica mundial de 2008. A nova esquerda está 5 pontos percentuais acima, nas intenções de voto, do partido governista, segundo a Folha de ontem. A experiência pode iluminar caminhos para outras nações ameaçadas pela onda neoneoliberal que percorre o planeta.

Se ocorrer, a vitória da Coligação de Esquerda Radical (Syriza) sobre a Nova Democracia será fruto direto da débâcle que atingiu o Partido Socialista (Pasok). Ao aceitar a orientação austeritária imposta pelo FMI, pelo Banco Central Europeu e pela Comissão Europeia, como, aliás, o fizeram os congêneres social-democratas em todo o sul da Europa, o Pasok viu o seu patamar de votos cair de 43% em 2009 para incríveis 5% agora, abrindo espaço para uma oposição anticapitalista renovada.

Não é para menos. A orientação contracionista provocou uma recessão brutal, elevou o desemprego para a casa dos 25% e trouxe perdas de renda da ordem de 30% para trabalhadores e aposentados. O gabinete de direita que tomou o lugar dos socialistas em 2012 manteve a conduta anterior e, por isso, agora deverá ceder o poder a um agrupamento originário do outro lado do espectro.

Com algo como 35% dos votos, a Syriza –ela própria uma federação de grupos– será obrigada a fazer alianças ao centro para compor o governo. É isso que deve explicar o tom moderado do artigo que Alexis Tsipras, provável primeiro-ministro, publicou terça passada no "Financial Times", uma das bíblias dos investidores. "Temos obrigação de negociar aberta, honestamente com os nossos parceiros europeus. Não tem sentido cada lado brandir as armas", escreveu Tsipras, numa visível tentativa de baixar a fervura.

Na mesma direção, Tsipras fez questão de diminuir o temor de que Atenas deixe o euro, ameaçando o projeto de integração nascido dos trágicos escombros da Segunda Guerra Mundial. "Um governo da Syriza vai respeitar as obrigações da Grécia enquanto membro da zona do Euro", escreveu o líder dos radicais, "no entanto, é aspecto fundamental da democracia que o novo governo eleito decida por si mesmo como deve atingir tais objetivos".

Isto é, a força ascendente não abre mão de suspender o programa de austeridade que produziu a catástrofe humanitária dos últimos anos na Grécia. Para equacionar o problema da dívida, que não é possível simplesmente repudiar, Tsipras fala em onerar a oligarquia econômica que evade impostos.

Os desafios serão enormes. Seja como for, tudo indica que parcela do futuro da democracia e da justiça social começará a se jogar na Grécia a partir de segunda-feira.


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