Folha de S. Paulo


Antes de demitir ou dizer que projeto acabou, é preciso se preparar muito

Crises exigem mudanças e alterações de rota que sempre levam os gestores a decisões dificílimas. O caso mais grave, sem dúvida, ocorre quando o corte de verbas resulta em demissões. Despedir um funcionário é uma tarefa dura, porque trará um impacto imenso para o trabalhador e sua família -tanto do ponto de vista financeiro como emocional.

Por isso, o mínimo que o gestor pode fazer é se sensibilizar com a situação e se preparar muito para ter essa conversa, buscando transmitir respeito pelo funcionário e gratidão pelo trabalho realizado.

Porém, não são apenas as demissões que mexem com a vida dos funcionários. Ao decidir interromper um projeto, as empresas também frustram expectativas e sonhos de muita gente -e, muitas vezes, nem se dão conta disso.

Depois de colocar toda sua energia, sua competência e sua força de trabalho em prol de um projeto -ou, por que não dizer, de uma causa- o empregado vê o esforço ir por água abaixo da noite para o dia. E, muitas vezes, isso acontece sem que ninguém lhe dê satisfação. A comunicação se resume a um e-mail formal ou a uma reunião pragmática.

É claro que, quando o dinheiro se torna escasso, muitas vezes não resta alternativa. Porém, essa mudança deve ser comunicada com muita cautela e respeito, sempre levando em conta o impacto que trará às pessoas envolvidas. Quem anuncia uma decisão sem se colocar no lugar do outro pode causar insatisfação, desmotivação e até mesmo depressão.

Recentemente, vivi uma situação muito triste. Uma grande amiga, que durante 31 anos comandou um projeto voluntário em parte financiado pelo poder público, recebeu um comunicado dizendo que não havia mais verba para aquelas atividades.

Assim, num piscar de olhos, ela viu o trabalho de toda uma vida chegar ao fim sem que ninguém reconhecesse seus méritos ou discutisse alternativas. Ela, que nunca ganhou um centavo com aquela atividade e fez da ajuda ao próximo o sentido da sua existência, não suportou o baque. Morreu um mês depois.

Ela já tinha 88 anos, totalmente lúcida, dirigindo seu próprio carro. Não tenho dúvidas que o descaso e a falta de empatia a golpearam de forma fatal. Ainda que realmente não houvesse mais recursos para financiar o projeto voluntário, os responsáveis poderiam ter tido um pouco mais de empatia e consideração com o trabalho de uma vida inteira.

Pensar nas pessoas para além (e acima) dos números pode não alterar a decisão dos gestores, mas ao menos humaniza a sua administração e traz dignidade para suas ações. Pense nisso sempre que tiver de comunicar uma mudança que impacte a vida de alguém.


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