Folha de S. Paulo


Em briga com o Carnaval, Crivella age mais como pastor que como prefeito

Alex Ribeiro-1°.jan.2017/Folhapress
O prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella PRB), discursa ao tomar posse do cargo na Câmara Municipal, neste domingo (1º)
Marcelo Crivella durante discurso ao tomar posse como prefeito do Rio na Câmara Municipal

RIO DE JANEIRO - Cada louco com sua mania. Ou sua gestão. Marcelo Crivella, quem sabe com inveja de João Doria e sua cruzada contra a cracolândia, resolveu comprar de vez a briga com o Carnaval.

É a maior festa do Rio —neste ano atraiu 1,1 milhão de visitantes e injetou R$ 3 bilhões na economia— e funciona como laboratório da vocação da cidade para eventos gigantes. Mesmo assim, o prefeito age como se não tivesse sido eleito para um cargo laico. Quem atua é o pastor que, em suas missões na África, costumava exorcizar o demônio no corpo das pessoas.

Ao não pôr os pés no Sambódromo e não entregar as chaves da cidade ao rei Momo, Crivella no mínimo não cumpriu seu papel de anfitrião. Prefere a evangelização. Pois é disso que trata a ameaça de cortar em 50% a subvenção distribuída às escolas do Grupo Especial (a partir de 2016, cada agremiação passou a receber o dobro: R$ 2 milhões). Os recursos seriam remanejados para dobrar as diárias (de R$ 10 para R$ 20) destinadas a crianças matriculadas em creches conveniadas pela prefeitura. Na ótica do pastor, o Carnaval, banquete da carne, é o responsável por faltar o leite das criancinhas famintas.

Polêmicas midiáticas não escondem a realidade. O governo Crivella, até o momento, é uma decepção. Cipoal de equívocos, alguns constrangedores e de gosto duvidoso: o (péssimo) serviço de táxis virou "patrimônio cultural" e o futuro Museu da Escravidão e da Liberdade poderá ser o MEL. Por que não abrir logo a franquia Mel & Dendê?

A suspeitíssima Liga Independente das Escolas de Samba, controlada por bicheiros, reagiu com outra ameaça. A se confirmar o corte da verba, não haverá desfile em 2018. Faz-me rir. Com Crivella ou sem Crivella, com liga ou sem liga, existe uma só garantia: as ruas do Rio vão brincar no ano que vem mais um Carnaval fenomenal e infernal.


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