Folha de S. Paulo


O papa e os embaixadores homossexuais

Tasso Marcelo - 22.jul.2013/AFP
Balão com a frase
Balão com a frase "Deus é gay" é visto em ato para receber Francisco na Jornada Mundial da Juventude

Na semana passada, o papa voltou a falar de homossexualidade. Em um texto sobre vida familiar, intitulado "A alegria do amor" —Amoris Laetitia, no original em latim—, Francisco pediu mais integração e acolhimento em relação aos divorciados e aos homossexuais.

O Sumo Pontífice acha o tema importante. Já havia tratado a questão na volta de sua viagem ao Brasil, em 2013, quando surpreendeu o mundo ao declarar sua tolerância em relação aos LGBTs. " Quem sou eu para julgar", disse.

Francisco também recebeu em entrevista um casal gay e uma mulher transgênero. Em discurso e em ação, nunca houve um papa tão sensível aos direitos de igualdade LGBT quanto este. No entanto, nem tudo são flores no Estado do Vaticano.

O papa prega tolerância em relação aos LGBTs, mas, há apenas alguns meses, em sua qualidade de Chefe de Estado, não aceitou a indicação de Laurent Stefanini como embaixador da França no Vaticano. Stefanini é católico praticante, solteiro e homossexual. A homossexualidade parece ter sido o problema.

Isso aconteceu no ano passado. Então, no caso, podemos dar ao Sumo Pontífice o benefício da dúvida. Afinal, Francisco hoje fala de tolerância e pode ter evoluído sua visão sobre embaixadores franceses homossexuais. Esperemos que seja isso.

Mas, se for isso mesmo, como esperamos, Sua Santidade ainda tem certas instruções a dar a alguns de seus subordinados e prepostos, que insistem no discurso intolerante em relação aos LGBTs.

Continuemos a falar de embaixadores.

O embaixador dos EUA na República Dominicana, Wally Brewster, é abertamente homossexual. Sua indicação como embaixador se inseriu na política do governo Obama de valorização e promoção dos direitos das minorias. Além de Brewster, Obama nomeou outros cinco Embaixadores abertamente gays, e os direitos LGBTs tornaram-se um tema prioritário na agenda do Departamento de Estado.

A indicação de Brewster foi duramente criticada na República Dominicana. Seus maiores detratores foram as autoridades católicas do país, em especial o arcebispo de Santo Domingo, cardeal Nicolás de Jesús López Rodríguez. Referindo-se ao embaixador Brewster, o religioso declarou, entre outros impropérios, não acreditar que os EUA seriam representados por un "maricón".

Setores do catolicismo dominicano apoiam e promovem uma petição online que, no momento, pede a destituição de Wally Brewster do cargo de Embaixador. Alegam, no pedido, que ele não está à altura para representar os Estados Unidos, e que sua homossexualidade aberta agride os valores cristãos locais.

Segundo o "New York Times", o Vaticano ainda não teria tomado qualquer atitude para reprimir os ataques do Cardeal López Rodríguez contra o Embaixador Brewster , o que gerou protesto formal de Washington.

Os esforços do papa Francisco em relação às minorias sexuais têm de ser reconhecidos e celebrados. No entanto, se essa retórica tolerante da Igreja em relação aos LGBTs é mesmo sincera e bem intencionada, o tipo de discurso de ódio empregado pelo Cardeal López Rodríguez contra o embaixador americano homossexual não pode jamais ser admitido por Francisco e a cúpula do Vaticano.

Parece simples. E é.


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