Folha de S. Paulo


Estímulo fiscal com protecionismo, como quer Trump, é insustentável

Yin Bogu - 27.jan.17/Xinhua
(170127) -- WASHINGTON D.C., enero 27, 2017 (Xinhua) -- El presidente estadounidense, Donald Trump, pronuncia un discurso durante una conferencia de prensa conjunta con la primera ministra de Reino Unido, Theresa May, en la Casa Blanca en Washington D.C., Estados Unidos de América, el 27 de enero de 2017. El presidente de Estados Unidos, Donald Trump, indicó el viernes que aún es
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump

Da véspera da eleição norte-americana até o fim da semana passada, as Bolsas nos EUA subiram fortemente: 7% pelo índice S&P 500 e quase 10% pelo mais tradicional índice Dow Jones. O mercado acionário não deixou dúvida sobre sua avaliação positiva do governo Trump.

Parte da história parece decorrer da perspectiva de um pacote de estímulo fiscal, ancorado principalmente na redução de impostos (em particular os incidentes diretamente sobre as empresas).

Espera-se que, em resposta a isso, a atividade ganhe fôlego adicional e que os lucros (pós-impostos) aumentem, trazendo consigo os preços das ações, que refletem exatamente as expectativas de lucros futuros, devidamente descontados à taxa de juros em vigor na economia.

Outra parte da história, assemelhada, aparenta resultar do lucro adicional esperado caso a competição das importações seja, de fato, substancialmente reduzida. O aumento da demanda interna, casado com restrições às importações, faria com que as empresas domésticas pudessem elevar suas margens, fenômeno que também colaboraria para o aumento do valor das empresas.

É claro que não houve nenhum anúncio oficial dessas medidas. No entanto, considerando os acontecimentos da primeira semana de governo, entendo que levar os anúncios de campanha a sério é uma atitude bastante sensata.

Isso posto, conforme tive a oportunidade de explorar emcoluna anterior, a métrica do mercado para avaliar uma política é bastante específica: ele as avalia constantemente pela ótica do preço dos ativos.

Já o público as julgará por outros critérios, em particular se haverá melhora de bem-estar para a maioria dos eleitores: caso seja esse o caso, as políticas (junto com o governo que as adotou) continuam; senão, não.

Minha preocupação, no caso, é com a sustentabilidade dessas políticas, isto é, se poderão ser mantidas, ou se, em algum momento, será necessária uma correção. Eu me inclino para a segunda opção.

O estímulo fiscal ocorre em ambiente peculiar. A economia americana opera próxima ao pleno emprego. A medida tradicional de desemprego aponta para uma taxa de 4,7% em dezembro do ano passado, bastante próxima da observada antes da Grande Recessão.

Medidas alternativas, que levam em conta desalento e trabalho parcial, entre outros fenômenos, sugerem um pouco mais de folga no mercado de trabalho, mas não muita, e vêm em queda mais rápida do que a versão tradicional.

Sob tais circunstâncias, as pressões inflacionárias, modestas hoje, devem aumentar, levando a uma normalização mais acelerada da taxa de juros.

Embora deva deixar claro que não se trata de algo necessariamente ruim neste exato momento, há riscos consideráveis caso essas políticas se cristalizem, impedindo uma reação rápida quando as circunstâncias (desemprego e inflação principalmente) mudarem.

A combinação de estímulo fiscal com protecionismo é nossa velha conhecida: mantida por muito tempo, deverá elevar a inflação e, consequentemente, também os juros, valorizando o dólar ante as demais moedas, por um lado, e piorando a evolução da dívida pública, por outro.

São, em suma, políticas insustentáveis, como aprendemos por experiência própria, mas cujos efeitos serão sentidos em escala global. Lá, como aqui, também terão que ser corrigidas.


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