Folha de S. Paulo


Embalagem: para que te quero?

Mudei-me de volta para São Paulo depois de anos em Montreal. Na primeira vez que fui ao supermercado, abismei-me quando a senhora à minha frente no caixa reclamou, zangada: "Mas que coisa, cobram caro e ainda fazem a gente pagar pelas sacolas!". Para quem mora na Europa ou na América do Norte, o normal é levar suas próprias sacolas –as descartáveis, só em caso de esquecimento, e paga-se sem reclamar.

Toneladas de plástico e outros sintéticos engordam as prateleiras –ocupam mais espaço do que o seu conteúdo. Quanto menores as porções de queijo ou iogurte ou biscoito, mais plástico e lata. Vejo cooperativas que transformam parte daquela lixarada em artesanato, e necessitados que catam latinhas e papelão para vender a quem recicla –mas é pouco.

Surgiu em Paris uma proposta ousada e cool para atacar a questão. O mercadinho Biocoop 21–pop-up que funcionará até fevereiro– não tem um produto embalado sequer. Frutas, verduras e grãos, vá lá, joga-se para dentro da sacola de feira sem susto. Mas esperam que os clientes tragam de casa potes de vidro e plástico usados para neles verterem azeites, vinagres, cereais, chás, etc.

O mercadinho de 65 metros quadrados é verde ao extremo. As peças de madeira certificada encaixam-se sem a necessidade de pregos ou cola. O máximo dos produtos vem das redondezas. E não é o primeiro: há o Unverpackt em Berlim e o In.Gredients no Texas. Ambos pequenos como o Biocoop 21 porque hoje ainda seria impraticável transformar um supermercado tradicional em algo assim.

O mais próximo disso que temos aqui são os mercadinhos amigáveis aos orgânicos e que dizem preocupar-se com o meio ambiente. Mas sempre abundam bandejinhas de isopor contendo dois raminhos de ervas cansadas ou umas poucas verdurinhas. Abolir embalagens? Rá! Num país onde tudo tem que ter etiqueta com sopa de letrinhas exigida pela Anvisa, a defasagem das embalagens sintéticas e a adoção da venda de produtos a granel é algo longínquo demais para vislumbrar.


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