Folha de S. Paulo


Fungo asiático é o inimigo número um das bananas no mundo

Volta e meia a notícia vem à tona: a banana está ameaçada de extinção por causa de pragas. Segundo especialistas, porém, o cenário não é tão desesperador assim. Também não é nada pacífico.

Talvez o maior dos fitovilões do momento seja o fungo Fusarium oxysporum, que causa a doença conhecida como mal do Panamá.

O Fusarium invade a bananeira pelas raízes e alcança o sistema vascular da planta, atingindo caules e folhas. Uma espécie de gosma impede que os nutrientes cheguem às diversas partes da planta. A consequência é uma espécie de murchamento, que dilacera a produção de frutas.

E o espalhamento do fungo é rápido. Resistentes a fungicidas, eles podem sobreviver décadas na forma de esporos e são encontrados no solo –logo, não basta matar a bananeira e plantar uma nova.

A melhor medida a ser tomada, explica o especialista Miguel Dita, da Embrapa, é evitar que a praga se espalhe. E ela pode se alastrar muito facilmente: maquinários agrícolas, animais, e até pela água.

Na China, houve grande disseminação por meio de água para irrigação, diz Dita. "Outro problema é que o material de plantio muitas vezes é assintomático, apesar de estar infectado. Aí a doença vai junto."

Em tempos de mudanças climáticas, essa última possibilidade causa ainda mais preocupação –grandes enchentes podem espalhar o micro-organismo de forma a tornar o manejo praticamente impossível.

O subtipo do Fusarium que assusta produtores de banana é o TR4 (tropical race 4), que tem uma predileção natural pela variedade de banana conhecia como Cavendish (ou nanica), mas que também pode afetar outras, como a prata e a maçã. Pelas contas de cientistas, a praga já afetou 100 mil hectares mundo afora.

QUEDA

A produção filipina de bananas para exportação vinha crescendo desde 2009, tendo chegado a 3,7 milhões de toneladas em 2014. Em 2015, despencou para 1,9 milhões de toneladas e um dos motivos foi a passagem destrutiva do TR4.

Felizmente, por ora, esse fungo parece estar restrito à Ásia, África e Oceania, o que faz com que países desses continentes concentrem esforços para a resolução do problema. "A doença ficou cerca de 20 anos restrita a países do sul da Ásia, mas em 2013 ela já apareceu na África e no Oriente Médio."

Uma das tentativas recentes de cientistas australianos foi fazer uma linhagem geneticamente modificada da banana. A planta doadora do gene é uma bananeira selvagem que rapidamente cresceu em campos arrasados pelo TR4 na Malásia.

Depois de alguns anos, os primeiros testes de campo, cruciais para qualquer tentativa de inserção comercial, estão começando. Pode ser o alento que produtores dessas partes do mundo precisam para garantir o abastecimento da fruta, considerada um alimento estratégico pela FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação).

Por ora, a produção do Equador, que exportou mais de 6 milhões de toneladas do produto em 2015, e de outros países da América Latina permanece incólume.

O engenheiro agrônomo Miguel Dita relata que há 10 anos estuda o problema no Brasil e se une ao coro dos especialistas, que dizem que a questão não é se a praga vai chegar até aqui, e, sim, quando isso vai acontecer.

No começo do século passado, as bananeiras da América Latina, da Colômbia e do Equador foram afetadas sobremaneira pela passagem do TR1. Naquela época, a variedade de banana que imperava era a Gros Michel (também conhecida como Big Mike).

A maior parte das bananas exportadas atualmente, do tipo Cavendish, são parentes de uma planta chinesa que apresentava uma resistência natural ao TR1.

A história se repete hoje com relação à infecção pelo TR4. Uma das fragilidades da cultura ao redor do globo é a falta de variedade genética: quase todas as bananeiras são parentes, com praticamente a mesma propensão a serem atacadas pelo fungo.

O perigo é tamanho que especialistas chegam a recomendar que, ao visitar países atingidos, turistas evitem trazer qualquer produto relacionado, até mesmo artesanato à base de fibra de bananeira –esporos do fungos podem estar entrincheirados ali.

A estimativa da FAO é que sejam necessários US$ 98 milhões para estabelecer programas de prevenção e combate no próximos anos.

O valor é alto, mas nem tanto, tendo em perspectiva o mercado bilionário da fruta. Calcula-se que o prejuízo com o mal do Panamá chegou a US$ 2 bilhões no século 20.

Pelas contas da agência da ONU, para cada real investido no programa, o benefício pode ser de R$ 98 a R$ 196 em um horizonte de 20 anos
O Brasil está empenhado em duas abordagens para frear o avanço do fungo: o emprego de solo supressivo –que inibe a ação do fungo–, e o melhoramento genético de plantas, por meio de sucessivas seleções de mudas.


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