Folha de S. Paulo


Mandamos alunos para o exterior rápido demais, diz presidente da Capes

Nagelstein/Folhapress
Abilio Neves, presidente da Capes, principal agência que financia ciência no país
Abilio Neves, presidente da Capes, principal agência que financia ciência no país

Nomeado na gestão Temer, o sociólogo Abílio Neves, novo presidente da Capes, principal agência de fomento à ciência do país, está em casa. Ele volta à instituição depois de tê-la chefiado de 1993 a 2005, no governo FHC.

A casa, no entanto, mudou: antes puxadinho do MEC, hoje a Capes tem um prédio inteiro em Brasília.

Os desafios também aumentaram: com orçamento 20% mais magro do que em 2015, a Capes tenta fechar as contas pagando bolsas de pesquisa nacionais e internacionais, do Ciência sem Fronteiras –programa que deve continuar, mas reduzido.

*

Folha - O que mudou na Capes da gestão FHC para a atual?
Abílio Neves - O orçamento da Capes hoje é muito diferente do que nós tínhamos quando deixei a instituição. Cresceu de R$ 570 milhões [em 2003] para R$ 5,6 bilhões em 2016 –que é um ano com cortes [em 2015, o orçamento da Capes foi de R$ 7 bilhões]. Isso é uma expressão de mudanças importantes pelas quais a agência passou.
Quando deixamos a Capes em 2003, tínhamos um andar de um anexo do MEC. Hoje, temos um prédio inteiro ocupado densamente. Tínhamos cerca de três mil cursos de pós-graduação [mestrado e doutorado] naquela época, agora deve passar de sete mil. Tudo ficou muito grande.

A Capes tem 20% menos de recursos do que em 2015, o dólar subiu. O Ciência sem Fronteiras ficou insustentável?
O Ciência sem Fronteiras tinha começo, meio e fim. Foi concebido para enviar cem mil pessoas para estudar no exterior e fez isso, não dá para dizer que o programa acabou. O problema do recurso foi diferente. Havia recursos extraorçamentários até 2013, quando o programa começou a comer orçamento das agências federais [Capes e CNPq].

Haverá nova versão do Ciência sem Fronteiras?
O ministro nos pediu uma proposta e nós fizemos uma sugestão que inclui todas as áreas. Dizer que o desenvolvimento do país exclui as humanidades não faz o menor sentido. Não tem como resolver problema urbano, violência e corrupção sem humanidades. Estamos convictos de que no Ciência sem Fronteiras 2 é preciso ter mais envolvimento das universidades na graduação e de que, na pós, precisamos pensar também na volta do estudante. Também é preciso aumentar a atratividade das universidades brasileiras. O jogo da internacionalização é atratividade, não adianta ficar fornecendo gente.

E como será o novo programa?
Essa pergunta tem de ser posta ao CNPq também, mas estamos pensando que o programa deve ser de agência, com versão CNPq e versão Capes. Ser um programa da presidência ajuda até certo ponto. Uma parte dos problemas do programa tem a ver com a rapidez que se teve de mandar os alunos para fora. Não teria mal nenhum se tivéssemos mandado os estudantes em seis anos. Na medida em que mandavam um monte de gente, descobriram que não tinha gente com inglês suficiente. Resolver o imbróglio na língua chegou perto de 30% do custo do programa.

Acho que a gente poderia assegurar, nas duas agências, no conjunto de modalidades, cerca de 10 mil bolsas por ano. É bastante coisa.
Universidade também pode fazer internacionalização. Tem universidade na Europa que define que o aluno deve passar seis meses em outro país para sua formação. Isso faria mais sentido do que repetir um programa episódico.

Uma das principais missões da Capes é avaliar a pós no país. A avaliação vai mudar?
A avaliação da pós está sempre mudando, ficou mais complexa. O que antes era mais impressionista, hoje é mais quantificado. Há mais indicadores. E, se você analisá-los, vai ver que o capítulo mais bem sucedido da educação brasileira é a pós.

Bem-sucedido como?
Em comparação com países em mesmo estágio de desenvolvimento que o Brasil, vemos que a nossa pós-graduação é mais sólida. A graduação continua muito distante de alguns países com universidades de qualidade.

Há programas de pós que trocam tese por artigos para aumentar produção e melhorar a avaliação. O que acha disso?
É discutível. Nas humanidades, o esforço da tese é maior do que de um artigo. Nas exatas e biológicas, os problemas podem ser abordados em pedaços.

-

Raio-X

Nome
Abílio Baeta Neves

Idade
66 anos

Cargo
Presidente da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) no atual governo de Michel Temer; foi presidente da instituição de 1995 a 2003

Formação
Sociólogo pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
Doutor em ciência política pela Westfälische Wilhelms Universität, de Münster, na Alemanha


Endereço da página: