Folha de S. Paulo


Maior produtividade da pecuária brasileira reduziria emissão de gases-estufa

Não é folclore nem é piada: gases produzidos na digestão de bois e vacas pioram o aquecimento global. Um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais mostra que dá para reduzir muito os arrotos e demais produções poluidoras dos 211 milhões de cabeças do Brasil –o maior rebanho comercial do mundo.

O equivalente a 115 milhões de toneladas de gás carbônico (tCO2eq, como se abrevia a medida padrão para gases do efeito-estufa) poderiam deixar de ser lançadas até 2030 apenas melhorando a produtividade da pecuária. Isso representa quase um décimo de todo o carbono emitido pelo Brasil anualmente.

O trabalho foi capitaneado por Britaldo Silveira Soares-Filho, do Centro de Sensoriamento Remoto, e Fabiano Alvim Barbosa, da Escola de Veterinária, ambos da UFMG.

Participaram ainda a ONG Aliança da Terra e centros de pesquisa americanos.

A pecuária bovina ocupa mais de um quarto do território nacional, 2,2 milhões de km2, dos quais 700 mil km2 na Amazônia. Com baixíssima produtividade, menos de cem cabeças por quilômetro quadrado, o rebanho sempre cresceu à custa da devastação de florestas.

"A pecuária é uma variável chave na equação do território brasileiro", diz Soares-Filho. "Dos assuntos que já estudei, é o mais difícil." A pesquisa demorou um ano e meio para ser concluída.

"O setor está em transformação muito rápida, não tem muito mais área para se expandir horizontalmente", constata o pesquisador, aludindo à pressão conservacionista que levou à redução de 80% nas taxas de desmatamento na última década.

A demanda por proteína animal só faz aumentar, por outro lado, tanto no mercado interno quanto no externo. O Brasil é hoje o maior exportador de carne bovina e envia 20% da produção ao exterior.

No entanto, nossa pecuária é muito ineficiente. Com apenas 88 milhões de reses, os EUA produziam em 2013 seus 11,7 milhões de toneladas de carne, 28,6% mais que os 9,1 milhões por aqui.

Editoria de Arte/Folhapress

INOVAÇÃO

A equipe simulou três cenários para a pecuária nacional, combinando diferentes taxas de crescimento do rebanho, de confinamento (em que animais recebem alimentação melhor) e de recuperação de pastagens degradadas.

Com capim melhor, bois e vacas crescem mais rápido e vão para o matadouro mais cedo. Não é raro no Brasil o abate ocorrer após os 40 meses, quando é possível fazê-lo aos 24. Seriam 16 meses a menos emitindo gases.

No melhor cenário, apelidado de "inovador", o rebanho chegaria a 250 milhões de cabeças em 2030 (em vez dos 300 milhões projetados pelo governo). As pastagens, no entanto, se reduziriam em 21%, para 1,74 milhão de km2.

No modelo rodado pelos computadores da UFMG, com a intensificação da atividade a produção de carne subiria para 12,4 milhões de toneladas. A produtividade daria um salto de 3,5 arrobas por hectare para 5,8 @/ha.

Em outras palavras: com pasto melhor e suplementação alimentar (rações balanceadas), o gado engordaria mais e mais rápido. Nesse processo, passaria menos tempo no pasto arrotando.

O xis da questão está no metano (CH4) produzido no rúmen. Para azar dos pecuaristas, e nosso, ele é um dos piores gases do efeito estufa, 21 vezes mais capaz de reter calor na atmosfera que o CO2.

Estima-se que cada rês, no sistema tradicional de criação, produza em média 53,4 kg de metano por ano. Com confinamento e outras boas práticas, esses arrotos cairiam para 40,3 kg/ano.

Os 115 milhões de tCO2eq podem parecer pouco, diante de 1,2 bilhão de tCO2eq emitidas anualmente pelo Brasil. Mas corresponde à poluição climática que seria produzida por uma frota imaginária de 115 milhões de carros 1.0 rodando 20 mil km por ano. E representa um quarto de todas as emissões atuais do setor agropecuário.

Conter o arroto dos bovinos parece um bom começo para levar a pecuária nacional até o século 21.

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