Folha de S. Paulo


Desmatamento não dizimou povos da ilha de Páscoa, diz estudo

Para muitos arqueólogos, a civilização nativa da ilha de Páscoa teria cavado a própria cova, promovendo o desmatamento desenfreado e assim acabando com a fertilidade do solo que a nutria. Um novo estudo, porém, sugere que tal ideia pode estar errada.

"Mudanças no uso da terra na ilha não parecem ter relação com degradação ambiental", apontam cientistas liderados por Christopher Stevenson, da Universidade da Comunidade da Virgínia (EUA), na revista científica "PNAS".

Os dados "vão contra a ideia de um colapso geral da população da ilha antes da chegada dos europeus".

"Colapso" é um termo-chave aqui, já que também é o título de um best-seller publicado em 2005 pelo biogeógrafo americano Jared Diamond.

O livro usa a ilha como um dos principais exemplos de sua ideia central: a falta de cuidado com o ambiente muitas vezes leva civilizações aparentemente poderosas ao buraco. "O colapso de Páscoa [pode ser] uma metáfora, a pior hipótese, daquilo que está nos esperando", escreveu. "É o mais claro exemplo de sociedade que se destruiu pelo abuso dos seus recursos."

Para Diamond e outros especialistas, o desastre teria começado após canoas polinésias aportaram pela primeira vez na ilha, em torno de 1000 d.C. O problema maior teria sido a agricultura polinésia, marcada pelo cultivo intensivo de batata-doce e inhame e pela criação de galinhas.

Os novos moradores de Rapa Nui (nome nativo da ilha) desmataram o lugar para plantar e também para usar a madeira como "trenós" que carregavam as grandes pedras usadas na construção das misteriosas moais, as famosas estátuas cabeçudas.

Editoria de Arte/Folhapress

Por um tempo, a população teria crescido. Mas uma crise ambiental teria levado enfim ao colapso da vida tribal, com guerras que desandaram para o canibalismo. Quando holandeses visitaram a ilha em 1722, a população já teria caído para 2.000 habitantes (de um auge estimado de 15 mil).

O novo estudo, porém, mostrou que a história talvez não tenha sido bem assim.

Foram datadas ferramentas de vidro vulcânico usadas na agricultura. De seis sítios arqueológicos, só dois mostraram uma diminuição clara de artefatos por 1600. Nos demais, a atividade agrícola parece ter seguido em níveis normais até o século 19. Outros estudos mostram ainda que não houve erosão significativa do solo antes dos europeus.

Ou seja, o desmatamento promovido pelos nativos não teria sido suficiente para acabar com a agricultura –eles teriam conseguido compensar a perda da floresta nativa com novas técnicas de cultivo.

Então, por que a civilização nativa da ilha teria ido para o brejo? É possível que epidemias trazidas por ocidentais, diante das quais os nativos não tinham defesas naturais, tenham levado a um colapso populacional ao longo dos séculos 18 e 19 –Páscoa foi anexada pelo Chile só em 1888.


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