Folha de S. Paulo


Cientistas criam programa de computador que analisa pinturas e identifica influências entre artistas

"Computadores são inúteis. A única coisa que eles nos fornecem são respostas."

Essa frase atribuída a Pablo Picasso reflete certa hostilidade dos artistas tradicionais quanto à tecnologia na década de 1970, mas naquela época ninguém achava que máquinas poderiam interpretar arte. Agora, um grupo de cientistas nos EUA acaba de mostrar que elas podem.

Ahmed Elgammal, especialista em inteligência artificial da Universidade Rutgers, de Nova Jersey, publicou na semana passada um estudo mostrando sua nova criação. Ele e colegas construíram um algoritmo –série de regras matemáticas, como aquelas embutidas em um software– capaz de analisar pinturas e identificar influências entre diferentes artistas.

Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress

Aplicando seu método sobre um banco de dados relativamente pequeno, com 1.710 imagens, Elgammal conseguiu fazer com que um computador identificasse cerca de metade das influências que costuma ser consenso entre historiadores da arte.

Identificando elementos como forma, composição de cena e até a representação de objetos específicos o programa conseguiu determinar por conta própria, por exemplo, que Picasso foi influenciado por Paul Cézanne e Georges Braque. E o próprio espanhol, por sua vez, teria influenciado Piet Mondrian e Paul Klee.

Surpreendentemente, o algoritmo, programado para buscar influências entre obras específicas, não apenas entre seus autores, foi capaz de descobrir semelhanças entre quadros ainda não relatadas por críticos de arte.

O exemplo mais notável talvez seja o de um quadro do francês Frédéric Bazille extremamente assemelhado a outro do americano Norman Rockell (veja à direita).

Durante o processo de desenvolvimento do algoritmo, Elgammal afirma ter discutido a ideia com diversos artistas e historiadores da arte. A reação deles à ideia foi variada, afirma.

"Alguns se mostraram realmente dispostos a usar ferramentas como essa em seus trabalhos para mineração de acervos com milhares de pinturas, pois há muitos bancos de dados que não estão nem classificados ainda", conta. "Já outros se mostraram céticos ou ofendidos por estarmos meio que pisando no território de autoridade deles."

Segundo o cientista, porém, a intenção de seu projeto de pesquisa não é a de produzir algo que seja capaz de dar conta da complexidade que é o trabalho de um crítico de arte ou um historiador.
"Nosso objetivo é apenas saber se computadores conseguem encontrar similaridades entre essas obras", diz.
As reações negativas a seu trabalho diz, talvez estejam relacionadas ao tabu de que obras de arte não possam ser analisadas com objetividade. Quando um computador obtém algum sucesso ao interpretar certo aspecto de uma pintura, pode haver uma sensação perturbadora.
Controvérsias à parte, o cientista diz que a intenção de seu grupo de pesquisa agora é a de aprimorar o algoritmo para que possa analisar mais aspectos de obras de arte. O próximo passo será o de tentar fazer seu método de análise sobre um banco de dados maior, que inclua milhões de pinturas.


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