Folha de S. Paulo


Ataques sexuais são comuns em pesquisas de campo, diz estudo

Um estudo por meio de entrevistas e questionários respondidos por pesquisadores e estudantes de 30 países apontou que 18% dos participantes relataram terem sofrido agressões sexuais de seus superiores ou de outros colegas em trabalhos de campo. O trabalho foi publicado na quarta-feira (16) pela revista eletrônica "PLoS One", da Biblioteca Pública da Ciência, dos Estados Unidos.

Os ataques relatados envolveram desde contatos físicos não desejados a estupros. Eles foram mais frequentes em mulheres, correspondendo a 26% das 516 entrevistadas e a 6% dos 142 homens que participaram. As respostas foram obtidas no primeiro semestre de 2013 e analisadas por quatro pesquisadoras da Universidade de Illinois.

A pesquisa destacou também que cerca de 90% dos relatos de ataques foram feitos por estagiários de graduação, pós-graduandos e pós-doutorandos. Além disso, cerca de 64% dos entrevistados afirmaram terem passado por assédios sexuais, principalmente por meio de manifestações verbais constrangedoras.

O estudo teve destaque não só em grandes jornais, como o "Washington Post" e o "USA Today", mas também em revistas científicas semanais como a britânica "Nature" e a norte-americana "Science".

As frequências das diversas formas de agressão e de assédio sexual registradas nesse trabalho foram compatíveis com outros levantamentos, afirmou a coordenadora da pesquisa, a bioantropóloga Kathryn Clancy, em entrevista à "Science". Ela lembrou que um relatório do ano passado sobre médicos registrou que 22% dos homens e 73% das mulheres tinham sofrido assédio sexual no local de trabalho durante a residência médica.

Da mesma forma, ao noticiar o novo estudo, a revista "Nature" destacou que um levantamento apresentado em abril de 2013, em um encontro da Associação Americana de Antropologia Física, apontou 18% de abusos sexuais e 59% de condutas impróprias em depoimentos de 123 pesquisadores.

Cerca de 75% dos participantes são dos Estados Unidos. O mesmo percentual correspondeu ao total de pesquisadores de antropologia e arqueologia. Os 25% restantes atuam em geologia, biologia e em outras áreas.

Clancy afirmou ter iniciado esse estudo motivada por centenas de comentários que recebeu após escrever, em 2011, em um blog na revista "Scientific American" sobre uma amiga que havia sofrido ataque sexual em sua universidade.

O questionários tinha 44 perguntas e foi distribuído por correio eletrônico e por meio de redes sociais. O estudo descreveu precauções das organizadoras para checar a autenticidade e evitar a duplicidade das respostas e para assegurar o anonimato dos entrevistados.

Além das informações obtidas por meio do questionário, o novo estudo se baseou também em entrevistas por telefone. "É devastador", disse Clancy na entrevista à "Science", referindo-se ao que sentiu ao fazer as entrevistas. "Algumas pessoas estavam com medo de reviver a experiência emocional."

Em suas instruções para os entrevistados, o questionário alertava: "Estas perguntas podem desencadear e estimular lembranças e fazerem você se sentir desconfortável. Se você tiver receio de que pensar ou compartilhar suas experiências com assédio ou agressão sexual poderá ser muito prejudicial mentalmente, não prossiga com esta pesquisa".

O artigo das quatro pesquisadoras destacou que menos da metade dos entrevistados demonstrou saber se existem códigos de conduta ou regras para o comportamento em atividades de campo ou em atividades gerais de pesquisa. Das 37 pessoas que denunciaram as agressões e assédios, entre elas apenas um homem, apenas sete disseram estar satisfeitos com as providências tomadas pelas instituições em que trabalham.


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