Folha de S. Paulo


Manto terrestre funciona como esponja que absorve água

Uma análise de ondas sísmicas que passam pelas profundezas da Terra parece confirmar algo que experimentos de laboratório tinham sugerido ser possível: que existe um oceano de água no manto, 640 quilômetros abaixo da superfície.

A água não se encontra em estado líquido: está dentro de minerais que existem nas pressões extremas encontradas nessas profundidades.

A descoberta leva a crer que os processos que ocorrem na parte menos profunda do manto e que causam erupções vulcânicas também ocorrem em profundidades maiores. "É uma nova visão da estrutura desta parte da Terra", disse Brandon Schmandt, da Universidade do Novo México.

O trabalho substancia a ideia de que a água da Terra se acumulou no interior do planeta durante sua formação. Assim, a água encerrada em minerais no manto, a camada de 2.900 quilômetros de espessura existente entre a crosta e o núcleo metálico quente, desgaseificou-se ao longo do tempo e chegou à superfície.

Os cientistas estudaram uma parte do manto chamada zona de transição, entre 480 quilômetros e 640 quilômetros de profundidade. A capacidade desta zona de conter água -e, aparentemente, conservar muita água-"pode ter alguma relação com a estabilização do tamanho dos oceanos", disse Steven D. Jacobsen, da Universidade Northwestern, outro autor do artigo. "Talvez seja afortunado que o interior da Terra tenha a capacidade de atuar como esponja."

Jacoben sintetiza minerais das profundezas da Terra, reproduzindo as pressões extremas presentes a centenas de quilômetros sob a superfície. Nas ocasiões em que ele produziu um mineral azul chamado ringwoodite, presente por toda parte na zona de transição, o mineral se formou com água. Mas Jacobsen disse que isso foi apenas um experimento de laboratório: "Não sabemos se isso poderia ocorrer lá embaixo".

Schmandt analisou dados sísmicos do projeto USArray, em que 400 sismômetros foram usados para criar imagens do manto. A análise indicou sinais de derretimento na zona de transição, em áreas onde a convecção estava levando o manto a fluir para baixo.

O derretimento do manto ocorre perto da superfície, criando o magma que é responsável por pontos de atividade vulcânica.

O processo é chamado derretimento de desidratação porque, à medida que partes do manto deslizam mais para baixo nos pontos de encontro das placas tectônicas, a pressão aumentada leva os minerais do manto a soltar a água que contêm, reduzindo a temperatura de derretimento. Mas, para Jacobsen, é difícil explicar o fato de terem sido encontradas evidências de derretimento em profundidades muito maiores, como Schmandt encontrou, "a não ser que se pense em água".

O trabalho dos cientistas sugere que o que acontece nas profundezas do manto é semelhante ao que ocorre perto da superfície, disseram os pesquisadores.

O estudo faz parte dos esforços para entender como a dinâmica da Terra profunda afeta o que acontece na superfície.

"Estamos tentando ligar os ciclos rochosos -por exemplo, a ação das placas tectônicas- com ciclos hídricos", disse Jacobson. "Quanto mais estudamos, mais o processo se aprofunda."


Endereço da página: