Folha de S. Paulo


Exibição de veste robótica na Copa foi apenas o início, diz paraplégico

Segundo o atleta paraplégico que deu o pontapé inicial simbólico da Copa do Mundo usando uma armadura robótica a ser controlada pelo cérebro, a breve demonstração, que mal foi televisionada, "não foi o fim, mas, sim, o início" do projeto que pretende criar uma armadura robótica para fazer pessoas paralisadas voltarem a andar.

Antes de aparecer para o mundo inteiro durante alguns segundos, Juliano Alves Pinto, 29, havia dado passos pela última vez na noite de 3 de dezembro de 2006, quando saiu de uma festa na cidade de Avaí (SP), em direção ao automóvel.

Reginaldo Castro/Folhapress
O paratleta Juliano Alves Pinto comemora participação na cerimônia de abertura da Copa. Créditos: Reginaldo Castro/Folhapress
O paratleta Juliano Alves Pinto comemora participação na cerimônia de abertura da Copa. Créditos: Reginaldo Castro/Folhapress

O carro que o transportava de volta para Gália (SP), onde mora, capotou na rodovia SP-294, a poucos quilômetros da entrada da cidade. No acidente, Juliano perdeu um irmão de 27 anos e também os movimentos da perna. "Sofri uma lesão na medula e os médicos me avisaram logo de imediato que não poderia voltar a andar."

Um dia depois de aparecer na TV vestindo o "exoesqueleto", a armadura robótica do projeto Andar de Novo, liderado pelo neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, Juliano voltou a Gália. Dezenas de carros e a população do município com menos de 8.000 habitantes saíram às ruas para homenageá-lo.

Desde o acidente, Juliano largou a profissão de vendedor e segue com o tratamento na AACD em São Paulo, onde participou da seleção para o "Andar de Novo".

Atualmente é paratleta na modalidade de corrida de cadeira de rodas e treina numa associação com sede em Marília (SP). Leia a entrevista de Alves Pinto à Folha.

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Folha - Como você foi escolhido para participar da abertura da Copa do Mundo?

Juliano Alves Pinto - Embora seja morador de Gália [a 395 quilômetros da capital], sou paciente da AACD de São Paulo há sete anos e meio, desde que sofri uma lesão na medula após um acidente de carro. No começo do ano, em janeiro, recebi um convite para participar de uma seleção. Estavam procurando pessoas com o meu peso, altura e a minha deficiência. Ao todo, 10 candidatos participaram do processo seletivo e, ao final, fui informado que havia sido o selecionado. Só depois me avisaram que seria para o chute simbólico com o exoesqueleto do projeto Andar de Novo, o Walk Again.

Você realmente teve a sensação de caminhar novamente usando o exoesqueleto?

Ali, no Itaquerão, consegui realizar dois sonhos: o de estar na abertura de uma Copa do Mundo e o de caminhar novamente. Quando eu era criança, jogava bola em Gália e sempre gostei de assistir aos jogos da Copa do Mundo. O exoesqueleto recebe as informações do cérebro e as transforma em força motora. Esse é o primeiro protótipo, o que significa que a Copa do Mundo não foi o fim do exoesqueleto, mas, sim, o início. Novas etapas vão surgir, o chute simbólico foi um marco de uma nova era da ciência.

O que passou pela sua cabeça naquele momento?

Realmente naquele momento eu voltei a ter a sensação de andar novamente. Senti uma emoção grande demais. Fiquei me sentindo muito satisfeito por representar milhões de pessoas que sofrem da mesma deficiência que eu sofro, que não podem mais movimentar as pernas. Andar, para muita gente, é algo simples, normal. Mas, para alguém que há sete anos e meio perdeu o movimento das pernas, aquele momento foi realmente muito especial.

Muitos cadeirantes chegaram a criticar o neurocientista Miguel Nicolelis. O que você pensa destas críticas?

Creio que são leigos sobre o projeto. Uma coisa é a pessoa criticar o projeto estando dentro, outra coisa é falar sobre ele de fora. O projeto surgiu para abrir novos caminhos, para devolver o movimento nas pernas de quem está hoje numa cadeira de rodas.

Você trocaria sua cadeira de rodas pelo exoesqueleto?

O exoesqueleto que usei na abertura da Copa do Mundo é um protótipo. Novas versões, mais aperfeiçoadas, vão surgir. Futuramente, daria sim para utilizar o exoesqueleto. O equipamento não é desconfortável, não dá choque.

Você, paratleta, pensa em disputar a Paraolimpíada do Rio de Janeiro, em 2016?

Sou paratleta na modalidade de corrida de cadeiras de rodas. Semanalmente treino na Amei [Associação Mariliense de Esportes Inclusivos], em Marília. Mas ainda estou sem patrocinador, os equipamentos são caros e com a aposentadoria que recebo por mês não daria para arcar com todas as despesas.


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