Paleontólogos ouvidos pela Folha dizem que há um clima de tensão nas atividades de pesquisa na região do Cariri, no Sul do Ceará. É lá que fica a Chapada do Araripe, um dos principais sítios paleontológicos do Brasil, reconhecido pela Unesco.
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Apesar do reconhecimento, Alexander Kellner é uma figura polêmica na paleontologia brasileira, atraindo desafetos dentro da academia por conta da maneira como conduz suas pesquisas –é chamado de "centralizador". Em 2011, ele se candidatou à presidência da Sociedade Brasileira de Paleontologia e perdeu a eleição. Ainda assim, mesmo entre seus detratores, as sanções foram vistas como absurdas.
Temendo represálias, ninguém quis se expor. "Se eles prenderam o Kellner, uma das pessoas mais conhecidas da área, o que não fariam comigo, que não tenho o mesmo reconhecimento?", diz o professor de uma universidade federal da região.
"Quem é considerado amigo [do DNPM] acaba tendo menos exigências. Todo mundo que vai pesquisar lá sabe disso", afirmou.
Outro pesquisador confirma: "Esse esquema é tão aberto que o chefe do DNPM na região [José de Artur Andrade] tem até espécie batizada em homenagem à colaboração".
David Martill, paleontólogo britânico que defende abertamente a venda de fósseis brasileiros, batizou uma tartaruga marinha pré-histórica de Araripemys artur em homenagem ao funcionário público. Há indícios de que o exemplar tenha saído ilegalmente do Brasil.
O procurador do Ministério Público Federal do Ceará Rafael Rayol não quis entrar na questão das disputas acadêmicas, mas disse que realizou um encontro com o DNPM e com pesquisadores para explicar os limites da atuação.
"Não foi preciso assinar um termo de ajustamento de conduta, porque foi a primeira vez que houve um erro de proporções tão grandes [prisão sob acusação de tráfico de fósseis]. Mas precisamos trabalhar de todos os jeitos para que isso não se repita, porque só prejudica a pesquisa na região."
Na opinião de Kellner, que é membro da Academia Brasileira de Ciências e recentemente foi eleito para a TWAS (academia de ciência para o mundo em desenvolvimento), o episódio já está afetando as colaborações de pesquisadores estrangeiros com o Brasil.
"Quem quer vir a um país onde pode acabar sendo preso por fazer seu trabalho? Já é possível notar que os pesquisadores estão com medo."