Folha de S. Paulo


Biólogos monitoram saúde de baleias belugas pelo hálito

Atendendo ao comando de seu treinador, uma beluga (baleia-branca) chamada Naku pôs seu queixo sobre o deque do tanque e exalou várias vezes, emitindo um som oco de "chuff" a cada exalação. O vapor subiu para uma placa de Petri que um pesquisador segurava sobre o espiráculo da baleia.

As gotas recolhidas contêm muitas informações. Pesquisadores do Aquário de Mystic e outros lugares estão aprendendo a usar o sopro (o ar expirado) de baleias e golfinhos para extrair e estudar hormônios, microorganismos, DNA e subprodutos metabólicos.

Rebecca Kessler/The New York Times
Os biólogos Lindsey Nelson e Justin Richard capturam sopro da baleia beluga fêmea Naku em uma placa de Petri
Os biólogos Lindsey Nelson e Justin Richard capturam sopro da baleia beluga fêmea Naku em uma placa de Petri

O objetivo é não só melhorar a saúde de cetáceos que vivem em cativeiro mas também desenvolver uma ferramenta poderosa e não invasiva para estudar os animais. Embora o sangue seja o "padrão ouro", ele é difícil de obter. "Creio que tudo o que está presente no sangue esteja também no sopro, só que em concentração muito mais baixa e um pouco mais difícil de medir", disse Kathleen Hunt, pesquisadora do aquário New England, em Boston.

Treinadores e veterinários que trabalham com baleias e golfinhos cheiram o hálito dos animais rotineiramente. O hálito normal de um golfinho tem cheiro de peixe. O cheiro de ovo podre é indicativo de problemas digestivos, e odores doces indicam pneumonia bacteriana, segundo o veterinário e neurobiólogo Sam Ridgway, da Fundação Nacional de Mamíferos Marinhos, em San Diego.

"Comparado com o que fazemos normalmente com animais silvestres -prendê-los, amarrá-los e colher amostras-, isto é o menos invasivo possível", disse Karina Acevedo-Whitehouse, epidemiologista molecular da Universidade Autônoma de Querétaro, no México.

Cientistas do aquário Mystic estão estudando não apenas o DNA como também hormônios reprodutivos e de estresse colhidos do sopro de Naku e suas três colegas de tanque. As quatro baleias-brancas não apenas sopram a pedido como deixam os cientistas colher sangue e amostras fecais. Em troca de peixes ou toques carinhosos em suas línguas, elas abrem seus maxilares para que sejam colhidas amostras de saliva.

Tracy Romano, que comanda o projeto, diz que poder comparar resultados dos quatro fluidos corporais é uma vantagem enorme na determinação dos métodos de estudo.

Rebecca Kessler/The New York Times
Uma das amostras de hálito de baleia coletadas na pesquisa
Uma das amostras de hálito de baleia coletadas na pesquisa

Em San Diego, cientistas da Fundação Nacional de Mamíferos Marinhos estudam um grupo de golfinhos treinados para atuar com a Marinha americana. O sopro deles já rendeu centenas de compostos -um tesouro molecular. "A possibilidade de descobertas é enorme", comentou a diretora do estudo, Cristina Davis, especialista em sensoriamento químico na Universidade da Califórnia em Davis.

Não é tão fácil estudar as baleias grandes. Os exames de sopro, somados a novas técnicas para a análise de biópsias de pele e gordura, fezes e fotos, devem ajudar a identificar os fatores de estresse, segundo artigo publicado no periódico "Conservation Physiology". Kathleen Hunt, autora principal do artigo, e sua equipe foram à baía de Fundy para aperfeiçoar o sistema de coleta do sopro de baleias-francas-do-atlântico-norte.

A técnica usada em Mystic -colocar placas de Petri sobre os espiráculos- não era uma alternativa viável. A equipe da cientista optou por uma garrafa plástica com o gargalo cortado e a abertura fechada com tule presa na ponta de uma vara.

A equipe encontrou hormônios que podem ser indicativos da maturidade e do status reprodutivo dos animais. Ao lado desses, identificou cortisol, hormônio cujo nível tende a subir em condições de estresse e que é visto como medida crítica de saúde.

Num artigo a ser publicado neste mês no "Marine Mammal Science", a equipe de Hunt relata que um exame simples, portátil e de baixo custo pode detectar hormônios no sopro. A descoberta deve abrir o campo a qualquer cientista curioso que estude baleias.


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