Folha de S. Paulo


Irã cobra pedido de desculpas de Arábia Saudita por tragédia em Meca

O líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, cobrou neste domingo (27) um pedido público de desculpas do governo da Arábia Saudita pela tragédia durante a peregrinação sagrada à Meca (Hajj), ocorrida na última quinta-feira.

As declarações foram feitas depois de um pronunciamento do presidente iraniano, Hassan Rouhani, na ONU, durante o qual ele pediu uma investigação sobre o incidente.

A Arábia Saudita acusa o Irã, por sua vez, de fazer 'uso político' da tragédia.

Pelo menos 769 pessoas morreram durante o tumulto, das quais mais de 140 eram iranianas. Foi o pior incidente do tipo em 25 anos.

O tumulto ocorreu na manhã da última quinta-feira, quando duas multidões que caminhavam em direções opostas se encontraram. Os peregrinos participavam do maior ritual do Hajj (peregrinação sagrada a Meca) —o apedrejamento do diabo, conhecido como 'Jamarat', quando se acredita que o demônio tenha tentado o profeta Abrãao.

"Essa tragédia não pode ser esquecida e os países cobrarão uma resposta (da Arábia Saudita)", afirmou Khamenei.

"Em vez de buscar culpados, o governo saudita deveria assumir a responsabilidade e pedir desculpas aos muçulmanos e às famílias das vítimas", acrescentou o líder religioso.

"O mundo islâmico tem várias perguntas. A morte de mais de 1.000 pessoas não é um assunto sem importância", disse Khamenei, em referência ao saldo de mortos, que tende a subir, segundo autoridades iranianas.

O presidente iraniano, Hassan Rouhani, descreveu a tragédia como "desoladora".

No sábado, o procurador-geral do país, Sayed Ibrahim Raisi, afirmou à TV estatal iraniana que o governo recorreria a tribunais internacionais para culpar legalmente a família real saudita pela tragédia, que descreveu como "crime".

Além dos mortos, 934 pessoas ficaram feridas no incidente.

'USO POLÍTICO'

O ministro das Relações Exteriores da Arábia Saudita, Adel al-Jubeir, que está em Nova York para participar da Assembleia Geral da ONU, afirmou neste domingo que "essa não é uma situação para ser usada politicamente".

"Esperaria que os líderes iranianos fossem mais sensíveis e mais previdentes em relação àqueles que morreram nessa tragédia e, dessa forma, aguardassem o resultado das nossas investigações".

Mais cedo, a figura religiosa mais importante do país, o grande xeque mufti Abdul Aziz bin-Abdullah al-Sheikh, defendeu as autoridades, dizendo que o tumulto foi "além do controle humano".

Após a tragédia, o rei Salman da Arábia Saudita ordenou uma revisão dos procedimentos de segurança adotados durante a peregrinação anual.

O incidente é o segundo ocorrido em apenas duas semanas, depois de um guindaste cair sobre a Grande Mesquita de Meca, matando 109 pessoas.

Sábado foi o último dia do Hajj, e nenhum outro incidente foi registrado.

ANÁLISE: SEBASTIAN USHER, EDITOR DE ORIENTE MÉDIO DA BBC

Na medida em que os peregrinos concluem os rituais finais do Hajj deste ano, à sombra dos eventos de quinta-feira, a contenda entre sauditas e iranianos sobre a responsabilidade da tragédia adquiriu contornos violentos.

O Irã perdeu pelo menos 140 cidadãos no incidente. Mas sua reação também tem motivações políticas, já que sua disputa com a Arábia Saudita pelo controle regional cresce a cada semana. A rivalidade entre os xiitas iranianos e os sunitas sauditas também possui uma dimensão religiosa.

Apesar dos bilhões de dólares que os sauditas gastaram na melhoria da infraestrutura do Hajj, há uma crítica crescente que não vem do arqui-inimigo Irã.

Críticos afirmam que a organização falhou em não atentar para a imensa quantidade de peregrinos que participariam do evento, um ponto básico haja vista que a peregrinação ocorre anualmente.


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