Folha de S. Paulo


Tim Vickery: Alfredo Di Stéfano foi o mais influente futebolista da história

Quem é o maior jogador de todos os tempos - Pelé ou Maradona? Essa é uma questão que me perguntam o tempo todo.

Comparações de estilos de jogadores são sempre difíceis, especialmente quando tratamos de diferentes eras, mas me sinto seguro em afirmar que nunca houve um jogador de futebol mais influente que Alfredo Di Stéfano.

O argentino naturalizado espanhol Di Stéfano, que morreu nesta segunda-feira aos 88 anos, nunca jogou uma Copa do Mundo, mas seu ambiente era o futebol de clubes, onde duas das competições mais importantes tiveram a marca dele - uma óbvia e direta, outra indiretamente.

Ele foi o último grande produto da era de ouro do futebol argentino nos anos 1940, quando estrelou o River Plate. Depois da grande greve dos jogadores por lá em 1948, ele foi levado pela recém-criada liga da Colômbia, e ajudou a alavancar o futebol local sendo o grande destaque do Millonarios. E em 1953, aos 27 anos, ele chegou ao Real Madrid para mudar o curso da história.

Quando a Copa Europeia - como a Copa dos Campeões era conhecida - foi lançada na temporada 1955-56 não havia garantia de sucesso. A Segunda Guerra Mundial era recente, e o continente estava se reconstruindo e começando a sair da austeridade pós-guerra.

As autoridades inglesas, desconfiadas o bastante daquilo tudo, não animaram o Chelsea a jogar a edição inaugural. Numa retrospectiva do caso, essa atitude parece ridícula, porque fez com que os ingleses perdessem o show de Di Stéfano.

O lendário meia-atacante inglês Bobby Charlton chegou perto dele em 1957, quando assistiu das arquibancadas o primeiro jogo das semifinais, com o Manchester United visitando o Real Madrid.

"Quem é esse homem?", foi a primeira sensação de Charlton. "Ele pega a bola com o goleiro, fala o que os defensores devem fazer; onde quer que esteja no campo, está posicionado para pegar a bola; você pode ver a influência dele em tudo que está acontecendo... Eu nunca havia visto um jogador tão completo. Foi como se ele tivesse criado um centro de comando no coração do jogo. Ele era tão forte quanto sutil. A combinação de qualidades era fascinante".

Toda a Europa foi passando pela mesma experiência. Di Stéfano levou o futebol a um nível que o continente nunca havia visto antes.

Ele não era apenas a força por trás do Real Madrid que venceu as cinco primeiras Copas Europeias, mas era também o grande responsável pelo rápido sucesso da competição. Todo mundo queria ver o Real Madrid de Di Stéfano.

Assim como aconteceu quando o Uruguai venceu a competição de futebol na Olimpíada de 1924 em Paris, vários talentos sul-americanos viraram febre na Europa. Se o Leeds United veste branco, se há um clube nos Estados Unidos chamado Real Salt Lake e se há uma Copa Europeia com sucesso imediato, muito do crédito pertence a Di Stéfano.

Alguns argumentam que com a liderança da galáxia do Real Madrid, Di Stéfano ajudou a melhorar a imagem externa da Espanha, incentivando o boom do turismo e, consequentemente, acelerando a integração do país na política da Europa ocidental na sequência da morte do ditador Franco.

Essa ideia poderia estar indo longe demais. Mas eu não acho que tal argumento seja exagerado, já que, sem ter a intenção, Di Stéfano também ajudou a dar vida à Copa Libertadores, a equivalente sul-americana da Copa Europeia.

Havia sérias dificuldades em criar uma competição no continente de nascimento de Di Stéfano - a América do Sul é gigante e a estrutura de transporte, longe do ideal hoje em dia, era primitiva.

Foi feita uma tentativa em 1948 ao juntar os melhores clubes do continente num torneio no Chile - Di Stéfano jogava pelo River Plate na época -, mas apesar do sucesso, o timming foi errado: a greve dos jogadores na Argentina estava prestes a explodir, o que teve como efeito isolar o país futebolisticamente e mandar Di Stéfano para a Colômbia.

Então não houve sequência, nem se considerou uma competição com jogos de ida e volta. Foi assim até um convite da Uefa, a entidade que comanda o futebol europeu.

Voltando ao outro lado do Atlântico, o sucesso da Copa Europeia estava deixando as pessoas curiosas: haveria uma equipe melhor que o Real Madrid em algum lugar do mundo? O continente que produziu Di Stéfano teria alguma coisa a mais?

A Uefa então sugeriu à Confederação Sul-Americana um confronto anual entre os campeões dos dois continentes. Os sul-americanos precisavam decidir um método de definir o campeão. E então surgiu a Copa Libertadores.

Sem os feitos de Di Stéfano no Real Madrid, isso não teria saído do papel tão cedo.


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