Folha de S. Paulo


China enfrenta impacto da exploração de terras-raras

No norte da China, perto da fronteira com a Mongólia, vazamentos contaminados com a radioatividade de duas décadas de refino dos metais conhecidos como terras-raras vêm escorrendo lentamente para o subsolo, em direção ao rio Amarelo, uma fonte de água vital para 150 milhões de pessoas.

Na província de Jiangxi, no centro-sul da China, o governo assumiu o controle da mineração de terras-raras, depois de descobrir o garimpo ilegal disseminado desses metais. Na província de Guangdong, no sudeste, os reguladores estão lutando para reparar campos e rios destruídos pelos ácidos poderosos das minas a céu aberto.

Recentemente, o impacto ambiental dessa atividade virou uma questão comercial internacional, e a China passou a gastar bilhões de dólares para limpar os danos da exploração de terras-raras.

Um painel da Organização Mundial do Comércio (OMC) em Genebra emitiu um esboço de relatório contra as restrições de exportação dos minerais pela China. A decisão final na próxima primavera, depois de uma provável apelação, talvez não faça uma grande diferença para a indústria de terras-raras, mas o caso parece ter tido o efeito inesperado de ajudar a China a empreender uma grande limpeza.

Maior produtor mundial de metais de terras-raras, a China impôs tarifas e limites de tonelagem anuais para as exportações desses produtos há sete anos. Então gradualmente aumentou os impostos e diminuiu os limites de tonelagem nos anos posteriores, lentamente reduzindo o suprimento para fabricantes no exterior.

A China alega que essas restrições de exportação são necessárias para proteger seu meio ambiente. Os EUA, a União Europeia e o Japão contestaram os impostos e as cotas da China na Organização Mundial do Comércio.

O caso das terras-raras "será um marco em termos de restrições de exportação e meio ambiente", disse James Bacchus, ex-presidente do tribunal de apelações da OMC em Genebra.

A China disponibiliza amplos suprimentos de terras-raras para fabricantes no próprio país, que com elas produzem componentes cruciais para uma série de produtos, como notebooks, lâmpadas fluorescentes compactas, turbinas de vento e carros elétricos. Algumas empresas ocidentais e japonesas mudaram suas fábricas para a China para garantir o acesso a esses metais.

As restrições chinesas à exportação se tornaram menos importantes nos últimos anos. Minas alternativas entraram em produção nos EUA e na Austrália, reduzindo a parcela chinesa da produção global para 85%, contra 95% três anos atrás. As companhias também ficaram muito mais eficientes na economia das terras-raras, especialmente das mais caras.

A mudança é visível no estoque de suprimentos de Tianjin, em uma das poucas fábricas mundiais que produzem pós de terras-raras para uso em ímãs muito poderosos. Seja em smartphones ou em mísseis, as aplicações mais avançadas para as terras-raras incluem a fabricação de componentes cruciais que usam as poderosas qualidades magnéticas desses minérios.

As autoridades chinesas negam que suas novas preocupações com as consequências ambientais da mineração e do refino de terras-raras sejam conduzidas pelo desejo de evitar a derrota na OMC.

As refinarias mais prejudiciais são as que rompem os laços químicos que ligam as terras-raras a minérios que também possuem materiais perigosos, notadamente o tório radioativo.
Muitas toneladas de ácido sulfúrico extremamente concentrado são usadas para romper as ligações químicas. Então os valiosos metais de terras-raras, que não são radioativos, podem ser purificados.

Mas isso deixa para trás uma perigosa mistura de substâncias tóxicas e lixo radioativo de baixo nível. Grande parte desses dejetos é despejada no maior lago de mina do mundo, perto de Baotou.

O lago não tem revestimento para evitar o vazamento de dejetos radioativos e toxinas para o lençol freático, de onde seguem para o rio Amarelo. Empresas estatais desmontaram as refinarias de Baotou e as reconstruíram em um enorme complexo de mineração em Bayan Obo, no deserto de Gobi, que extrai cerca de metade das terras-raras do mundo.

Muitos observadores acreditam que a China perderá o caso na OMC e terá de remover suas cotas e tarifas de exportação. Mas essas mudanças poderão não fazer grande diferença, porque a China passou os últimos anos forçando fusões, de modo que 99% das terras-raras mineradas legalmente no país são produzidas por apenas dez companhias. Porém, se elas forçarem os preços rápido demais, poderão enfrentar a concorrência de empresas nos EUA e na Austrália.

As forças de mercado poderão ter um efeito maior sobre a capacidade da China de controlar o mercado do que as restrições à exportação, disse Dudley Kingsnorth, analista na Austrália.
"Se isso fosse decidido cinco anos atrás, poderia ter causado algum impacto", disse ele.


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