Folha de S. Paulo


Popular, música por assinatura ainda rende pouco ou nada a empresas e a artistas

Quando o Spotify, a companhia de música digital da moda, anunciou um acordo exclusivo com o Led Zeppelin e acesso grátis em aparelhos móveis nesta semana, também reportou números impressionantes. Os usuários do serviço ouviram 4,5 bilhões de horas de música em formato stream este ano, e a empresa pagou mais de US$ 1 bilhão em royalties musicais desde sua fundação.

Mas o Spotify, um grupo de capital fechado, omitiu os resultados que os executivos do setor de música, os concorrentes e os investidores mais queriam saber: o número de assinantes do serviço, e o número de pessoas que pagam para usá-lo.

Serviços como o Spotify, Pandora e o novo iTunes Radio, da Apple, se tornaram a mais recente esperança para o sempre problemático setor de música. Permitem que os usuários ouçam on-line seus vastos catálogos de canções, quer gratuitamente, quer por meio de assinaturas que podem custar a partir de apenas US$ 3 ao mês.

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Vídeo do anúncio do Spotify, que passa a oferecer música gratuitamente em dispositivos móveis; serviço está indisponível aqui
Vídeo do anúncio do Spotify, que passa a oferecer música gratuitamente em dispositivos móveis; serviço está indisponível aqui

TRANSFORMAÇÃO

Com as vendas de downloads perdendo o ímpeto, depois de uma década de crescimento, a distribuição em formato stream tem o potencial de transformar o modelo financeiro do setor ao cobrar diretamente dos ouvintes. Em lugar de vender um CD ou download, as companhias faturariam royalties a cada vez que alguém clicasse para ouvir uma faixa on-line.

"Os hábitos de compra dos amantes da música estão mudando", disse Doug Morris, presidente do conselho da Sony Music Entertainment, a investidores, em uma conferência em Los Angeles no mês passado. "Em lugar de comprar discos, ou mesmo downloads digitais, os consumidores estão começando a preferir consumir música a pedido, usando serviços de streaming".

O streaming começou até a afetar a maneira pela qual música é produzida, com bandas jovens como Lorde, Imagine Dragons e Baauer conquistando boa parte de sua popularidade e de sua força de mercado por meio de plataformas de streaming.

Mas ainda que estejam crescendo, as companhias de streaming vêm encontrando um problema persistente: os amantes de música a consomem em grande volume enquanto ela for gratuita, mas se provou muito mais difícil convencê-los a pagar uma assinatura mensal.

A Pandora, a única companhia de música em formato stream que tem capital aberto, distribui cerca de 1,5 bilhão de horas de música ao mês, a mais de 70 milhões de usuários, mas apenas três milhões deles pagam. Os demais ouvem de graça, mas precisam suportar publicidade para fazê-lo. Ainda que seu valor de mercado seja de US$ 5 bilhões, a Pandora até o momento não saiu do vermelho.

"Existe uma resistência irracional das pessoas a pagar pelos serviços de streaming", diz Ted Cohen, consultor na TAG Strategic. "Já faz 13 anos que surgiu o fenômeno da 'música de graça', via Napster, e é difícil convencer as pessoas a retornar à ideia de que a música no mínimo vale o mesmo preço semanal que uma xícara de café no Starbucks".

Os vídeos musicais gratuitos no YouTube o tornam a plataforma musical favorita de todos os jovens ouvintes, de acordo com a Nielsen.

Quando Daniel Ek, presidente-executivo do Spotify, foi perguntado sobre o número de assinantes de sua companhia, disse que "não somos o tipo de empresa que atualiza seus números a cada milhão de novos assinantes conquistados. Nós os informaremos quando sentirmos que atingimos marcos importantes".

CONCORRÊNCIA

Atingir esses marcos pode se provar um desafio cada vez maior. Com diversos rivais importantes se preparando para entrar no mercado nos próximos meses, a concorrência no segmento de música em formato streaming vai se intensificar.

A Beats Music, serviço por assinatura criado pelos fabricantes dos fones de ouvido Beats by Dr. Dre, chegará em janeiro, acompanhada por uma agressiva campanha de marketing. O YouTube e a companhia francesa Deezer também devem passar a oferecer planos de música por assinatura no mercado dos Estados Unidos. Eles se unem a um mercado já repleto de serviços de streaming, que incluem Rdio, Rhapsody, Google All Access, Xbox Music, da Microsoft, e Music Unlimited, da Sony.

E enquanto todas essas companhias lutam entre si por assinantes, enfrentam o desafio adicional de convencer os usuários a pagar por música em formato stream.

A estratégia do Spotify vem sendo a de atrair usuários com uma versão gratuita, bancada por publicidade, na esperança de que possam ser "convertidos" e paguem entre US$ 5 US$ 10 ao mês por vantagens como som de melhor qualidade e música sem anúncios. Mas o serviço, criado na Suécia em 2008 e hoje disponível em 55 mercados de todo o mundo, não divulga números atualizados sobre seu total de assinantes desde março, quando tinha 24 milhões de usuários, seis milhões dos quais pagantes.

O acesso gratuito limitado que a Spotify anunciou para aparelhos móveis, esta semana, serve em parte como forma de continuar atraindo usuários que passam mais tempo nos seus celulares e tablets do que no computador.

Ek disse que metade dos usuários novos da Spotify estavam assinando por meio de aparelhos móveis. Uma maneira de atrair novos usuários, para o Spotify, é oferecer acordos exclusivos com grupos musicais muito populares, como o assinado com o Led Zeppelin nesta semana.

A Beats Music não deve oferecer opção de acesso gratuito, e aposta que os ouvintes considerarão o serviço suficientemente atraente para pagar por ele desde o começo. O plano pode ser atraente para os músicos, que se queixam de que os royalties recolhidos dos serviços gratuitos são baixos demais para que se sustentem. Os royalties pagos pelos serviços pagos tendem a ser bem mais altos.

No mundo da música em formato stream, a opinião dominante é a de que o mercado ainda é jovem e tem imenso potencial.

Em 2012, os serviços de música em formato stream e as rádios via satélite nos Estados Unidos contribuíram com pouco mais de US$ 1 bilhão em receita para a indústria fonográfica, aumento de 59% ante o ano anterior. Mas o número ainda é baixo comparado aos US$ 5,6 bilhões dos downloads e vendas físicas, de acordo com dados da Recording Industry Association of America (RIAA), a associação setorial das gravadoras norte-americanas.

MENOS CDS, MAIS STREAMING

O crescimento do streaming deve continuar em ritmo ainda mais rápido em 2014, e as vendas de CDs e os downloads provavelmente cairão.

"Demorou muitos anos para que os downloads digitais se tornassem uma opção forte no mercado, em companhia dos CDs, e com o tempo as assinaturas serão uma terceira opção adotada de maneira ampla", disse Anthony Bay, presidente-executivo do Rdio.

O Rdio, criado em 2010, não informa seu número de assinantes, mas nesta quinta-feira (12) lançou uma campanha de marketing por meio de um acordo com a Cumulus Media, gigante do setor de rádio norte-americano, a fim de promover seu serviço na programação das rádios da companhia.

Não se sabe claramente de quantos assinantes um serviço necessita para se tornar sucesso no mercado, ainda que o Spotify pareça ter adotado os 40 milhões como meta. O número é usado pela companhia para demonstrar quanto dinheiro ela poderá contribuir para o setor de música assim que atingir uma escala dominante.

A maioria dos demais serviços não divulgam seus resultados, mas executivos e analistas de música estimam que o número total de assinantes de serviços de streaming nos EUA seja superior a 5 milhões. Os números empalidecem em comparação com os de outras companhias de mídia, a exemplo do Netflix, que conta com 31 milhões de assinantes, ou da Sirius XM Radio, com mais de 25 milhões.

PAGAR, EU?

Diversos analistas duvidam que as companhias de música em formato stream sejam capazes de atrair assinantes pagantes em número suficiente se oferecerem apenas música, citando a queda acentuada nas vendas de música nos últimos 10 anos e a ampla disponibilidade de música gratuita na internet. E dizem que será difícil sobreviver com base apenas no faturamento publicitário.

Em lugar disso, alguns deles veem o sucesso dessas empresas como vinculado ao chamado "modelo de subsídio", no qual as vendas de música servem de base a um segundo negócio com margens mais altas. A Apple, especialmente, usou a venda de música, com baixa margem de lucro, para estimular a demanda por seus iPods, celulares e computadores.

"A música é um acompanhamento, que você acrescenta à sua corrida, ao seu dia de trabalho, à sua preparação de refeições na cozinha", disse James McQuivey, analista da Forrester Research. "Mas não é algo pelo qual você esteja ansioso por pagar, se não for preciso".

E existe a feroz concorrência, com a chegada de novos competidores em número cada vez maior.

Perguntado sobre a concorrência, Ek, do Spotify, apontou que havia muitos rivais quando sua empresa surgiu. E muitos deles, como o Myspace Music, Napster e Zune, perderam estatura ou desapareceram de vez. Mas ele disse que estava feliz por ser líder, e não desafiante em busca do primeiro posto.

"Prefiro ser caçado", disse Ek, "do que me ver na condição de caçador".

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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