Folha de S. Paulo


Aos 3 anos, Lava Jato deixa histórias esquecidas em meio a escândalos

Histórias Perdidas

Entre milhares de documentos produzidos pelas investigações nesses três anos de Operação Lava Jato, há histórias que acabaram esquecidas em meio a uma avalanche de revelações.

Uma delas é a coleção de 20 relógios de luxo das marcas Cartier, Rolex, Tissot e Bulgari do ex-senador Delcídio Amaral (ex-PT-MS), preso em 25 de novembro de 2015 por ordem do então ministro do STF Teori Zavascki.

Na época, ninguém soube, com exceção dos investigadores e outras pessoas diretamente envolvidas na investigação, que a Polícia Federal apreendeu o material na casa do então senador, no bairro Bela Vista, em Campo Grande (MS). O auto de apreensão com a descrição dos objetos só foi anexado ao inquérito após mais de um ano.

Um dos modelos apreendidos, um Rolex Oyster Yacht Master, é vendido por mais de R$ 28 mil. Um Carrera Calibre 16 é encontrado por R$ 18 mil. Um terceiro, um Rolex Oyster Perpetual Datejust, oscila de R$ 7,4 mil a R$ 8,9 mil.

O advogado de Delcídio, Antônio Figueiredo Basto, afirmou que até a sexta-feira (24) os relógios continuavam apreendidos no STF. "Só tem aquisição lícita. Ele tem outras rendas", afirmou. Indagado se o ex-senador tem como demonstrar a origem dos recursos, o advogado disse que o Ministério Público é que tem que apontar se houve algum crime.

"Ele não recebeu nenhuma propina, nunca recebeu, o dinheiro que entrou foi para caixa dois de campanha eleitoral", disse o advogado.

CARGOS ATENDIDOS

Em uma operação desencadeada com ordem do STF como desdobramento da Lava Jato em 2015, a Catilinárias, a PF apreendeu na sede da empresa do senador Fernando Coelho (PSB-PE), a Excelsus Participações, em Petrolina (PE), papéis que também só foram anexados tempos depois à investigação.

Havia um arquivo de computador intitulado "cargos atendidos" com 74 nomes e funções em órgãos públicos distribuídos por 12 municípios do Estado. Ao lado do nome e do cargo, há informações sobre quem pediu o cargo, como "indicação do prefeito". O arquivo de computador foi produzido em 2012.

Em outro papel apreendido na empresa, em um e-mail enviado em 2006, quando Coelho era prefeito de Petrolina (PE), um publicitário pediu R$ 30 mil para incluir o político como um dos agraciados do prêmio "Orgulho de Pernambuco" daquele ano, um evento então promovido pelo jornal "Diário de Pernambuco". Naquela época, segundo a atual direção do jornal, o veículo era gerido por outros empresários. O publicitário autor do e-mail também não trabalha mais com o jornal.

No e-mail, ele apresentou a Coelho uma saída engenhosa para emitir a nota fiscal. "Na papelada de faturamento não falaremos em 'prêmio ou troféu' e sim que você ou a Prefeitura paga essa importância", escreveu no e-mail. Pela proposta, em troca do pagamento o jornal iria publicar um "caderno especial" ("Essa página vai contar sua trajetória vitoriosa", escreveu o publicitário), além de deixar para Coelho um espaço reservado "quando for de seu interesse, em cores e no dia que for determinado".

A assessoria do senador disse que ele não pagou qualquer quantia relativa ao prêmio. "Tivemos inclusive o cuidado de pesquisar arquivos e confirmamos que Fernando Bezerra não foi homenageado naquele ano. Fernando Bezerra Coelho não se recorda de ter ido a algum evento (festa) relacionado ao referido encarte (de 2006)", informou a assessoria.

COMPRA DE VOTOS

Outra operação deflagrada com autorização do STF na Lava Jato, a Politeia, de julho de 2015, localizou uma série de anotações na casa de um ajudante parlamentar então lotado no gabinete do senador Fernando Collor (PTC-AL). Segundo a PF, os papéis "indicam compra de votos", com uma "relação de material de construção, quantidade de votos, nome, número de título eleitoral e seção".

A PF concluiu que a movimentação de recursos do assessor estava muito acima de sua capacidade financeira. A assessoria de Collor afirmou que o homem "faleceu no ano passado de causas naturais".

Disse ainda que o material apreendido na residência do assessor não tem qualquer relação com Collor e que, em 2016, o caso foi encaminhado pelo STF à Justiça Eleitoral.

Alan Marques/Folhapress
 Delcídio do Amaral em reunião do Conselho de Ética do Senado, em Brasília (DF)
O então senador Delcídio do Amaral, em reunião do Conselho de Ética do Senado

Endereço da página:

Links no texto: