Folha de S. Paulo


CPI da Petrobras muda de tom com Marcelo Odebrecht e faz até elogios

Giuliano Gomes
O executivo Marcelo Odebrecht, preso na Lava Jato, durante depoimento à CPI da Petrobras em Curitiba
O executivo Marcelo Odebrecht, preso na Lava Jato, durante depoimento à CPI da Petrobras em Curitiba

Presidente de um grupo que doou R$ 111 milhões a campanhas eleitorais em 2014, Marcelo Odebrecht teve em seu depoimento à CPI da Petrobras uma mudança de tom por parte dos deputados e até mesmo elogios.

Marcelo foi preso em junho em uma das fases da Operação Lava Jato –depois, teve a prisão prorrogada e é acusado de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa pelo Ministério Público Federal.

Com outros depoentes que respondem a acusações semelhantes, parlamentares costumam acusá-los e dizer a eles que irão passar muito tempo presos caso não delatem o que sabem.

Em seu depoimento, Odebrecht rejeitou fazer acordo dizendo não ter o que delatar.

Mas, com Marcelo Odebrecht, os questionamentos foram diferentes. Ao ser chamado para depor, Marcelo chegou à mesa da CPI e cumprimentou todos os deputados que lá estavam. Logo em sua fala inicial, o empreiteiro fez um afago dizendo que estava à disposição de perguntas, mas que não poderia falar sobre detalhes relacionados ao processo que responde. Ele é réu com outros executivos do grupo na Lava Jato.

O relator Luiz Sérgio (PT-RJ) chamou-o de "jovem executivo de uma das mais importantes empresas brasileiras" e defendeu que "pela importância da empresa para o desenvolvimento e as obras e empregos que geram no país, o instrumento de [acordo de] leniência seja preservado para que ela possa se manter".

Fez perguntas a Marcelo sobre quais são os mecanismos das doações eleitorais e qual a diferença entre as licitações na Petrobras e nos governos estaduais, mas não obteve resposta.

"Esse é o tipo de matéria que faz parte do processo criminal e com certeza será levado aos autos pela minha defesa. Agradeço a oportunidade de fazer a defesa publicamente, mas faremos isso nos autos do processo", disse o empreiteiro.

Em seguida, o deputado Altineu Côrtes (PR-RJ), que costuma ser incisivo em suas perguntas, afirmou a Marcelo que uma vez conversou com funcionários da empreiteira que o elogiaram. "Descreveram o senhor com um orgulho assim que me marcou", afirmou, para depois perguntar se ele estudaria fazer uma delação premiada.

'NÃO PRECISA PEDIR DESCULPA'

Ao responder ao deputado Bruno Covas (PSDB-SP), Marcelo Odebrecht pediu desculpas por não poder dar detalhes sobre um ponto de sua defesa. Recebeu a compreensão do parlamentar: "Não precisa pedir desculpa, é um direito, não tem o que desculpar ou deixar de desculpar".

O deputado Valmir Prascidelli (PT-SP) perguntou-lhe se considerava "adequada e correta a prisão, considerando que se colocou sempre à disposição". Marcelo não respondeu. "A minha vontade de responder é muito grande, mas essa resposta fará parte da estratégia de defesa", disse.

Alguns arriscaram questões mais incisivas. O deputado Delegado Waldir (PSDB-GO) afirmou que Marcelo era denunciado por corrupção 56 vezes e 36 vezes por lavagem de dinheiro. "O senhor está preocupado com isso?". Não obteve resposta.

O deputado Carlos Andrade (PHS-RR) disse a ele que "a sociedade brasileira hoje vê a Odebrecht envolvida no maior escândalo de corrupção, inclusive com contas no exterior" e Marcelo respondeu que se tratava de um "fenômeno da publicidade opressiva" e que contava com o apoio dos deputados para reverter essa imagem.

Ao fim, o presidente da empreiteira se desculpou novamente por não poder responder a tudo e foi liberado pelo presidente da CPI, deputado Hugo Motta (PMDB-PB). Em entrevista, Motta disse não ter considerado que houve mudança de tom e que cada deputado é responsável por suas perguntas.

O advogado Nabor Bulhões, que defende Marcelo Odebrecht, destacou que a fala do executivo na CPI buscou chamar atenção para o cerceamento de defesa que ele e outros investigados na operação vêm sofrendo. "A defesa tem que conhecer não só o teor da acusação, mas todos os elementos que o MPF (Ministério Público Federal) se baseia para fazer a denuncia, e isso não aconteceu até agora. A situação é preocupante, traduz um enorme cerceamento de defesa para todos os acusados, entre eles o Marcelo", disse à Folha.

Em agosto, a defesa do executivo protocolou uma petição solicitando ao juiz Sérgio Moro acesso a todas as delações premiadas que foram usadas pelo MPF para oferecer a denuncia contra Marcelo Odebrecht. O documento também pede acesso a registros sobre as doações bancárias envolvendo as empresas Intercorp, Trident, Klienfeld, Pexo Corporation e Quinus, e à integra de processos instaurados pelas Comissões Internas de Apuração da Petrobras, entre outros materiais.

BENEFICIÁRIOS

As empresas do grupo Odebrecht doaram R$ 918 mil aos membros da CPI nas eleições do ano passado. Foram dez parlamentares beneficiados, entre os 54 integrantes da comissão (incluindo suplentes).

O presidente da CPI, deputado Hugo Motta (PMDB-PB), foi um dos que mais receberam: R$ 200 mil da Construtora Norberto Odebrecht. O mesmo valor foi doado pela Braskem, braço petroquímico do grupo, a João Carlos Bacelar (PR-BA). Em terceiro lugar, aparece o deputado Izalci (PSDB-DF), que recebeu R$ 150 mil da Odebrecht Óleo e Gás –envolvida diretamente com as obras na Petrobras.

Os valores incluem tanto doações feitas diretamente aos candidatos quanto recursos doados a diretórios partidários e redirecionados aos parlamentares.

Também receberam recursos da holding os deputados Augusto Coutinho (SD-PE), Júlio Delgado (PSB-MG), JHC (SD-AL), Antonio Imbassahy (PSDB-BA), Paulo Magalhães (PSD-BA), Félix Mendonça Júnior (PDT-BA) e José Carlos Araújo (PSD-BA).


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