Folha de S. Paulo


Força Nacional vai a MS após sumiço de crianças guarani-caiová

Homens da Força Nacional de Segurança foram enviados a uma área de litígio em Coronel Sapucaia, no sul do Mato Grosso do Sul, uma semana após o desaparecimento de duas crianças da etnia guarani-caiová. Os índios foram expulsos da área por pecuaristas que disputam o local.

As crianças, de 10 e 11 anos, ainda não haviam sido localizadas. A suspeita dos indígenas é que eles tenham sido sequestrados. Os produtores rurais, por meio do Sindicato Rural de Amambai, negam qualquer envolvimento com o sumiço dos garotos.

"Não seria a primeira vez que um caso como esse acontece. Eles [os fazendeiros] são capazes de tudo para nos pressionar a desistir de lutar pelo que é nosso", afirmou Awákuaray Guarani-Caiová, 35, uma das lideranças da etnia.

Segundo ele, 70 indígenas foram expulsos e estão concentrados em um descampado na mata. ONGs têm fornecido comida ao grupo.

Os índios, segundo Awákuaray, foram retirados à força, na quarta-feira passada (22), por pecuaristas. Homens, mulheres e crianças da etnia estavam em um acampamento, erguido desde segunda-feira (20), nas terras conhecidas como Kurusu Ambá. A área abriga também a fazenda Madama. Os indígenas alegam que, mesmo com a chegada de 30 homens da Força Nacional na sexta-feira (24), continuam a ser ameaçados e atacados por jagunços.

De acordo com os guarani-caiová, durante a expulsão, seus barracos foram incendiados e dezenas de índios acabaram feridos. Ao menos quatro mulheres teriam ficado gravemente feridas, segundo o Cimi (Conselho Indigenista Missionário).

Cerca de 40 produtores rurais participaram da ação. O sindicato rural diz que os produtores apenas reagiram às investidas dos indígenas e que estavam defendendo a propriedade.

A área em disputa abrange 18 mil hectares, segundo o Cimi, o equivalente a 11 parques Ibirapuera. O local ainda não foi demarcado. Quatro fazendas se encontram no território.

Os guarani-caiová reivindicam a posse da área, que, segundo eles, era tradicionalmente ocupada por seus antepassados. Eles argumentam que foram obrigados a deixar os acampamentos anteriores devido às constantes ameaças.

Existem duas aldeias dos guarani-caiová perto da fazenda, reconhecidas pela Funai, sendo que a mais próxima fica a 20 quilômetros da sede da propriedade.

A área em disputa integra o tekohá (terra sagrada) Pyelito Kue, no extremo sul do Estado, que em 2012 ganhou atenção mundial a partir de uma carta escrita pelos guarani-caiová. No texto, eles denunciavam as más condições de vida em que se encontravam, além de cobrarem a demarcação das terras.

O documento foi interpretado por ativistas como anúncio de suicídio coletivo do grupo de 170 acampados na fazenda Cambará, no município de Iguatemi. O suposto suicídio não se concretizou.

GOVERNO FEDERAL

A demarcação de áreas indígenas, fruto de um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) entre Funai e Procuradoria, está paralisada desde 2013, segundo o procurador Ricardo Pael. "A responsabilidade pelo conflito fundiário é toda do Ministério da Justiça", diz o procurador.

Ele também criticou o fato de a Polícia Federal e Força Nacional enviarem equipes ao local somente após o conflito, "apesar de já estarem cientes da situação potencialmente violenta na região".

"O Ministério da Justiça age, assim, com grave omissão, desrespeitando os direitos constitucionais dos indígenas." O procurador classificou como "grave" o desaparecimento das crianças.

Em nota, o Ministério da Justiça informou que "a Força Nacional encaminhou equipes ao local assim que foi acionado pelo Estado" e que o efetivo "permanecerá fazendo barreiras e rondas na região por tempo indeterminado". Segundo a pasta, "a situação permanece estabilizada".


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