Folha de S. Paulo


Ex-deputado confirma que doleiro dizia captar doações de empreiteiras

Em depoimento prestado à Polícia Federal, o ex-deputado federal João Pizzolatti Júnior (PP-SC) confirmou que o doleiro Alberto Youssef costumava afirmar, cerca de três anos antes do início da Operação Lava Jato, que os parlamentares do PP "possuíam um débito com ele", pois captava doações para campanhas eleitorais das empreiteiras que mantinham vínculos com a Petrobras.

Ex-homem forte no PP e atualmente no cargo de secretário extraordinário de Relações Institucionais e Promoção de Investimentos do governo de Roraima, Pizzolatti foi citado diversas vezes por Youssef, em seu acordo de delação premiada, como um dos parlamentares beneficiados pelo esquema de desvio de recursos da Petrobras.

Pizzolatti falou à PF em Brasília em 8 de maio. Nesta semana, a PF repassou ao STF (Supremo Tribunal Federal) as íntegras dos depoimentos de 23 políticos investigados por suposta participação no esquema e pediu prazo de mais 60 dias para dar continuidade às apurações —o pedido será analisado pelo relator dos inquéritos no STF, ministro Teori Zavascki.

Ainda precisam ser tomados 11 depoimentos, entre eles o do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Embora tenha negado participar de irregularidades, Pizzolatti deu mais mais detalhes sobre as relações entre Youssef e o PP.

O ex-deputado revelou que, após a morte do deputado federal José Janene (PP-PR), em 2010, Youssef "passou a se arvorar como interlocutor de Paulo Roberto Costa junto ao PP", em referência ao ex-diretor de Abastecimento da Petrobras e rambém delator da Lava Jato.

Alan Marques - 13.jul.2011/Folhapress
O ex-deputado João Pizzolatti (PP-SC) confirmou à PF que Youssef intermediava doações de empresas
O ex-deputado João Pizzolatti (PP-SC) confirmou à PF que Youssef intermediava doações de empresas

Segundo Pizzolatti, o doleiro "passou a pressioná-lo" para que apoiasse a manutenção de Costa na diretoria de Abastecimento, o que teria causado "indignação" no então deputado.

Pizzolatti disse que Youssef falava que parlamentares do PP possuíam um "débito" com ele, por ser um dos protagonistas em conseguir apoio para doações oficiais de campanha para o PP, provenientes de contratos de empreiteiras com a Petrobras, "as quais eram de inteira responsabilidade de José Janene".

O ex-deputado disse que não concordou com as pressões do doleiro e com ele "quase chegou às vias de fato". O episódio teria ocorrido por volta de 2011. O escândalo da Petrobras só veio à tona a partir de março de 2014. Assim, Pizzolatti procurou se mostrar à PF como um desafeto do doleiro, o que explicaria as citações ao seu nome nos depoimentos do delator.

Segundo Pizzolatti, Janene foi o responsável direto pela indicação de Costa à direção da estatal e não permitia que ninguém se aproximasse das tratativas acerca da captação de recursos para campanhas do PP. O ex-deputado disse que a captação das doações das empresas fornecedoras da Petrobras também ficava sob responsabilidade de Janene.

Pizzolatti contou que também manteve encontros com Costa. Por volta de 2010, segundo ele, organizou um jantar em homenagem a Costa em um restaurante em Brasília, a pedido do ex-diretor, com membros da bancada do PP no Congresso. Pizzolatti disse que o então diretor da estatal procurava "realizar uma aproximação da bancada e buscar apoio, já que havia perdido seu 'padrinho' [Janene]".

O ex-deputado disse que atenderam ao convite do jantar entre 30 e 40 pessoas, cujos nomes preferiu não mencionar para "não cometer injustiças", e que Costa apareceu no restaurante ao lado do doleiro Youssef –o que teria "causado constrangimentos" entre os convidados.

O ex-deputado disse não se lembrar quem pagou a conta do jantar. Outro parlamentar do PP contou que o evento ocorreu no restaurante Francisco, em Brasília.

DESAVENÇAS

Em depoimento à PF, o deputado Nelson Meurer (PP-PR) confirmou parte do depoimento de Pizzolatti ao dizer que seu colega e o doleiro Youssef não estavam se entendendo, embora não tenha explicado o motivo da desavença.

Ele também afirmou ter presenciado "um pedido de Youssef para que o PP mantivesse o apoio" à permanência de Costa na diretoria de Abastecimento. Segundo o relato de Meurer, Pizzolatti negou o pedido de Youssef. Segundo ele, o desentendimento do então deputado com o doleiro era "de conhecimento do partido".

Meurer admitiu, como outros parlamentares, que Costa era indicado pelo PP. "Era de conhecimento de todos que tal função era de reserva do PP; [...] a Diretoria de Abastecimento [da Petrobras] e o Ministério das Cidades eram cotas do partido PP junto ao governo federal", disse.

"O governo precisa compor sua base para possibilitar a governabilidade, sendo assim, os partidos, além de votarem os projetos do governo, em contrapartida possuem cotas como essas, até para 'se sentirem parte do governo'", narrou o parlamentar.

Meurer reconheceu que esteve "duas ou três vezes" no escritório de Youssef de São Paulo, mas alegou que era apenas para se encontrar com um irmão de Mario Negromonte (PP-BA) que trabalhava com o doleiro.

PP

Responsáveis pela indicação de Costa, os parlamentares do PP representam mais da metade do número total de investigados nos inquéritos em andamento no STF.

Ao todo, 50 pessoas são alvo de inquéritos no STF, sendo 35 congressistas —13 senadores e 22 deputados.

Nos depoimentos já prestados, senadores, deputados e ex-deputados atribuíram ao comando do partido o trabalho de captação e distribuição de recursos para eleições, procurando eximir-se de qualquer pedido às doadoras de campanha.

Segundo os pepistas, o doleiro, conhecido como "primo" dentro da sigla, tentou ocupar o espaço deixado pelo ex-deputado Janene, quis "sacrificar" a legenda nas investigações e cometeu "ato de desespero" ao fechar o acordo de delação premiada para tentar diminuir sua pena.


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