Folha de S. Paulo


Governador do MA estuda alternativas para o museu de José Sarney

O governador do Maranhão, Flávio Dino (PC do B), está estudando o que fazer com a FMRB (Fundação da Memória Republicana Brasileira), que administra, com recursos públicos, o acervo do ex-presidente José Sarney, seu adversário político.

Chamada até 2011 de Fundação José Sarney, a entidade foi transformada em instituição pública pela então governadora Roseana Sarney (PMDB), filha do ex-presidente. Mais de 40 mil itens, entre documentos e presentes recebidos pelo ex-presidente foram transferidos para a guarda do Estado, que gastou mais de R$ 8 milhões com o órgão entre 2012 e 2014.

Além de consumir recursos públicos e estar instalada em um prédio colonial de 1654 no centro histórico de São Luís, o Convento das Mercês, a fundação é controlada por um conselho curador no qual Sarney, na condição de patrono, tem o direito vitalício e hereditário de indicar dois de seus nove integrantes.

Na última semana, Dino recebeu de seu secretário de Transparência e Controle, Rodrigo Lago, sugestões de medidas para definir um novo rumo à fundação. O governador ainda não decidiu o que fazer.

Entre as opções estão o envio, para a Assembleia Legislativa, de alterações na lei que criou a FMRB e transferiu a ela o acervo de Sarney. Dino poderia, por exemplo, anular o patronato que permite a Sarney indicar os dirigentes da entidade.

A fundação tem 48 funcionários, todos comissionados (indicados) e cuja folha de pagamento, segundo a Secretaria de Gestão e Previdência, é de R$ 174 mil mensais. A previsão de despesas para este ano é de R$ 3 milhões, recursos que saem do orçamento da Secretaria de Estado da Educação.

Uma das medidas que Dino poderia tomar seria reduzir a quantidade de comissionados e instituir cargos efetivos, mas isso geraria mais despesas, por exemplo, com a realização de concurso público.

O governador também tem a opção de extinguir a fundação e determinar uma nova destinação para o acervo, que poderia ser cedido para a União, uma universidade ou um museu.

A Folha apurou que Dino consultou auxiliares sobre a possibilidade de devolver todo o material para Sarney, mas isso não seria possível em caso de extinção da fundação. Uma vez cedido ao Estado, o acervo se torna patrimônio público e não poderia ser doado a uma pessoa física.

Os itens só poderiam voltar a Sarney se a lei que criou a FMRB fosse considerada inconstitucional. Nesse caso, a doação do acervo ao Estado seria nula e ele seria devolvido.

Folhapress
Pátio interno do Convento das Mercês, onde fica a Fundação da Memória Republicana Brasileira, em foto de 2010, quando havia uma estátua de José Sarney em tamanho natural
Pátio interno do Convento das Mercês, em foto de 2010, quando havia uma estátua de José Sarney em tamanho natural (esq.); assessoria afirma que a obra hoje está na residência do ex-presidente

AÇÃO NO STF

Uma ação que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal) pede justamente que a lei seja declarada inconstitucional. Ela afirma que a criação da fundação violou princípios republicanos ao instituir um órgão público destinado a "reverenciar" a figura de Sarney e lhe garantir a indicação vitalícia de dirigentes.

O pedido teve parecer favorável da Procuradoria-Geral da República em 2013 e desde então aguarda julgamento no Supremo. O relator do processo é o ministro Dias Toffoli.

Em dezembro, antes de assumir o governo do Maranhão, Dino afirmava que tentaria pautar o julgamento da ação. Essa hipótese, no entanto, seria a mais demorada, o que fez com que seus auxiliares começassem a estudar outras medidas.

A privatização da fundação é, atualmente, descartada. "Não há nenhuma intenção do governador em privatizar", disse o secretário de Articulação Política, Márcio Jerry, um dos mais próximos de Dino.

OUTRO LADO

Em nota, o senador José Sarney (PMDB-AP) afirma que nunca fez promoção pessoal na FMRB e que a instituição é "um grande monumento cultural, o mais visitado do Estado, e tem prestado grandes serviços educacionais, culturais e turísticos".

Segundo o peemedebista, a fundação tem objetivo de "estudar e debater os problemas brasileiros e maranhenses, defender o patrimônio histórico e cultural, pesquisar a história do Brasil, ibero-americana e lusófona, promover o intercâmbio cultural", entre outros.

O senador compara a importância da fundação com a FGV (Fundação Getulio Vargas), "como centro de estudos, de difusão cultural e de preservação da memória".

Na nota, Sarney ironiza o governador Flávio Dino (PC do B) ao fazer referência ao stalinismo soviético, regime totalitário que vigorou sob o líder comunista Josef Stálin, de 1922 1953.

"Considerar que a cultura e a história não fazem parte dos ideais republicanos é ignorar o que é a República. Nunca fiz nenhuma promoção pessoal minha ali. O Stálin é que mandou refazer a enciclopédia russa, retirando o nome dos que não apoiavam o regime e a ele mesmo; exemplo maior Trotsky", conclui.

Leia a íntegra da nota:

Com relação à preservação do acervo da Fundação da Memória Republicana Brasileira (FMRB), em São Luís, o senador José Sarney faz o seguintes comentários:

1) Cabe exclusivamente ao governo do Maranhão definir suas prioridades de acordo com o interesse público.

2) A importância da Fundação da Memória Republicana Brasileira para o Maranhão é a mesma que tem a Fundação Getulio Vargas (FGV) para o país como centro de estudos, de difusão cultural e de preservação da memória.

3) A Fundação José Sarney foi extinta. Durante seus 20 anos de existência não recebeu um centavo de verbas estaduais. Em 2011, a Assembleia Legislativa criou uma nova Fundação, da Memória Republicana Brasileira, com o objetivo de estudar e debater os problemas brasileiros e maranhenses, defender o patrimônio histórico e cultural, pesquisar a história do Brasil, ibero-americana e lusófona, promover o intercâmbio cultural, ensinar e pesquisar, além de responsabilizar pela guarda e manutenção do acervo doado por mim, constituído por mais de 1 milhão de documentos, grande acervo iconográfico, mais de 4 mil peças museológicas, além de uma biblioteca de 40 mil volumes. Esse acervo é considerado pela Lei 8394/91 como patrimônio nacional por tratar-se de acervo presidencial, e protegido como previsto na Constituição e na legislação infraconstitucional. A FMRB é hoje um grande monumento cultural, o mais visitado do Estado, e tem prestado grandes serviços educacionais, culturais e turísticos.

4) O governo tem obrigação legal de preserva-lo, pois são 1 milhão de documentos da História do Brasil, com mais de 400 mil digitalizados e disponibilizados na internet. Destruí-los é crime.

5) Considerar que a cultura e a História não fazem parte dos ideais republicanos é ignorar o que é a República. Nunca fiz nenhuma promoção pessoal minha ali. O Stálin é que mandou refazer a enciclopédia russa, retirando o nome dos que não apoiavam o regime e a ele mesmo; exemplo maior Trotsky.


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