Folha de S. Paulo


Análise: A regra é clara?

Nossa Constituição prevê que ocupantes de determinados cargos públicos (senadores, deputados, governadores, etc.) não serão julgados criminalmente por juízes de 1ª instância e sim por tribunais. A relação de qual tribunal julgará cada pessoa está na própria Constituição.

Durante 35 anos (de 1964 a 1999) o STF (Supremo Tribunal Federal) manteve o entendimento de que se o crime tivesse sido praticado no exercício do cargo, o foro privilegiado deveria prevalecer mesmo depois da pessoa deixar o cargo que ensejou a competência especial. Desde a mudança, no entanto, o STF tem oscilado sobre essa competência.

Em 2007, o STF decidiu, por maioria, que a renúncia do então deputado federal Ronaldo Cunha Lima às vésperas do julgamento pelo crime de tentativa de homicídio fazia cessar a competência do STF para julgá-lo.

Já em 2010, diante de renúncia semelhante envolvendo o então deputado federal Natan Donadon – acusado de peculato (desvio de recursos públicos) e formação de quadrilha–, o STF decidiu, também por maioria, que poderia julgá-lo. Donadon foi condenado pelo STF e hoje cumpre pena. Com a renúncia do senador Eduardo Azeredo, denunciado por peculato e lavagem de dinheiro, a questão retorna ao STF.

Para a população, o desfecho desse julgamento transcende o caso em si. O que importa é conhecer as "regras do jogo" e saber que situações semelhantes serão julgadas da mesma forma.

Para o STF, essa definição também é importante. A certeza de que o STF decide de acordo com a Constituição – e não segundo a composição do tribunal na época do julgamento– é fundamental para reforçar a confiança nas instituições e especialmente no órgão de cúpula do Judiciário brasileiro.

Thiago Bottino é professor da FGV Direito Rio


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