Folha de S. Paulo


Campos 'certamente' terá votos dos sem-terra, diz Stedile

Tradicionalmente alinhado ao PT, o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) "certamente" terá muitos de seus militantes votando no governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), para presidente da República em outubro. A avaliação é de João Pedro Stedile, da coordenação nacional do movimento.

"Na região de Pernambuco, na Paraíba, onde ele [governador de Pernambuco] tem influência, certamente vai ter muita gente da nossa base, do MST, que vai votar no Campos", disse Stedile à Folha.

Para o dirigente, apesar das críticas públicas que o também presidente do PSB vem fazendo à gestão de Dilma Rousseff, sua candidatura representa o mesmo "projeto neodesenvolvimentista" da petista, que disputará a reeleição.

O PSB rompeu aliança nacional com o PT em setembro passado, depois de ter apoiado os governos de Lula e Dilma durante dez anos. O líder sem terra considera que Campos tem direito a pleitear a disputa do Planalto, "como qualquer cidadão".

Stedile esteve em São Paulo para divulgar o 6º Congresso Nacional do MST, que terá início na próxima segunda-feira (10), em Brasília. O evento deve reunir cerca de 15 mil participantes, além de 200 delegados de movimentos sociais do exterior.

No congresso, o MST pretende apresentar uma proposta de "Reforma Agrária Popular", baseada não apenas na distribuição de terra, mas também na reivindicação ao aumento do número de escolas rurais e de estímulo a cooperativas agroindustriais.

Em entrevista coletiva, Stedile disse que o movimento tem "obrigação" de criticar a política agrária da administração federal. "O governo Dilma foi bundão para reforma agrária, não teve coragem de fazer desapropriação. Nos oito anos do Lula, a média era de 80 mil famílias [assentadas] por ano em áreas desapropriadas. Nos três anos da Dilma, a média foi 30 mil, porém a metade foi em projetos de colonização na Amazônia. Em área desapropriada mesmo, foi 15 mil. O governo sabe que está em dívida conosco", afirmou.

ELEIÇÕES

Depois da coletiva, ele falou com a Folha sobre as eleições deste ano e ironizou a possibilidade de o empresário do setor sucroalcooleiro Maurilio Biagi Filho, filiado ao PR, ser indicado como vice do ex-ministro e pré-candidato petista ao governo de São Paulo, Alexandre Padilha. "Ele [o ex-ministro] está se aliando com a parte falida do agronegócio, porque os poderosos do setor sucroalcooleiro são as empresas transnacionais: a Bunge, a Cargill, a Shell."

O ex-presidente Lula acredita que Biagi possa vencer a resistência de parte do agronegócio paulista ao PT no Estado.

A seguir, alguns trechos da conversa com a Folha:

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DILMA E CAMPOS
"A disputa eleitoral vai ser entre o projeto dos tucanos, que é recolocar a economia brasileira sob o domínio do capital financeiro e das multinacionais, e este projeto neodesenvolvimentista que está aí. Dentro do projeto neodesenvolvimentista há as duas candidaturas: a reeleição da Dilma e a candidatura do Campos, que é apenas uma nuance do mesmo projeto, tanto é que a campanha dele tem oito ex-ministros do Lula. Ele foi governador, foi ministro, tem o direito de postular [a Presidência] como qualquer cidadão."

APOIO DO MST
"Na nossa base, todo mundo tem liberdade de votar em quem quer, e vejo até com naturalidade que na região de Pernambuco, mesmo na Paraíba, onde ele tem influência, certamente vai ter muita gente da nossa base, do MST, que vai votar no Campos. Não por afinidades ideológicas, mas por algum tipo de afeto que [o eleitor] tenha, por ser mais conhecido [no Nordeste], por ter mais jeito de político do que a Dilma. Na nossa base, tem voto pra tudo. Só esperamos que não votem na direita."

PSDB
"A candidatura dos tucanos não tem nenhuma chance de se viabilizar, tanto pela postura pessoal do Aécio [Neves] quanto pelo que significou o neoliberalismo, que já foi derrotado. Os tucanos não conseguiram adequar o discurso, ter um projeto de oposição real, então é muito difícil eles convencerem a população. Se houver disputa, vai ser entre o mesmo projeto, da Dilma e do Campos."

MARINA SILVA
"Causou uma certa indisposição na militância essas alianças que ela fez com a Natura, o banco Itaú, que prejudicam a imagem dela, de defensora dos mais pobres, do meio ambiente. Quando a militância vê notícias dela vinculada a grupos econômicos, gera um mal-estar, como uma demonstração de contradição. Mas é uma pessoa progressista e também está nesse campo do neodesenvolvimentismo. Foi uma pena ela não ter conseguido registrar o partido [Rede Sustentabilidade], para poder se posicionar como candidata. Ela teria oportunidade de explicitar seu próprio programa e, pelo menos, teria que explicar essa aliança durante a campanha."

GOVERNO PAULISTA
"Voto no Rio Grande do Sul. Mas o que eu sinto da população, pelo pouco que ando aqui em São Paulo, é que há um desejo de mudança, uma saturação dos governos tucanos. E espero que haja mudança. Se votasse em São Paulo, votaria no Padilha. Mas como voto no Rio Grande do Sul, votarei no Tarso Genro, que é o único governador de esquerda do país. Pode escrever aí. Tem posturas de esquerda, não camufleia, é um homem comprometido com as ideias de esquerda."

VICE USINEIRO
"Eu confio na honestidade política do Padilha. E por esses nomes que você está citando [o ex-usineiro Maurilio Biagi Filho], ele está se aliando com a parte falida do agronegócio, porque os poderosos do setor sucroalcooleiro são as empresas transnacionais: a Bunge, a Cargill, a Shell... Esses são os nossos verdadeiros inimigos."


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