Folha de S. Paulo


Julgamento do mensalão tucano não deve afetar eleições, diz Anastasia

O governador mineiro Antonio Anastasia (PSDB), 52, deve deixar o cargo no final de março próximo para disputar uma vaga no Senado.

Ele sairá a contragosto, já que nunca almejou o Legislativo. Apesar disso, demonstra que não terá saudades do comando do Executivo: "Acho que é mais alívio do que [sentimento de] falta".

Advogado, professor universitário e visto como um quadro técnico tucano, ele admite o cansaço de três mandatos seguidos (o atual, um como secretário de Planejamento e coordenador-geral e outro como vice de Aécio).

Reclama dos eventos noturnos ("Isso cansa demais"), do salário ("É muito baixo") e da incompreensão das pessoas com o real alcance de um governador ("Isso desgasta").

A seguir, sua entrevista à Folha, concedida na última quinta-feira na residência oficial, em Belo Horizonte, no Palácio das Mangabeiras.

Bruno Figueiredo-11.dez.2013/ODIN/Folhapress
O governador de Minas, Antonio Anastasia (PSDB), durante entrevista no Palácio das Mangabeiras, em Belo Horizonte
O governador de Minas, Antonio Anastasia (PSDB), durante entrevista no Palácio das Mangabeiras, em Belo Horizonte

*

Folha - O sr. está próximo de deixar o governo, num ciclo iniciado em 2003. O que o sr. gostaria de fazer daqui para a frente, independentemente do desejo do PSDB?
Antonio Anastasia - Desde o início nunca tive pretensões de ser governador. A minha carreira é voltada para a administração pública, exercendo cargos em comissão, de natureza política. As circunstâncias me levaram a vice-governador e depois governador. Minha pretensão inicial era concluir o mandato ao final do ano que vem. Mas surgem essas solicitações para que eu deixe o governo no final de março para a candidatura ao Senado. Como sou governador não por minha vontade, mas por vontade de um grande grupo político, naturalmente tenho responsabilidades e deveres. Então será uma decisão coletiva.

É bom ou não ser político?
Ser político é bom, a despeito da imensa incompreensão que as pessoas têm em relação aos políticos. A imagem do político hoje no Brasil é muito ruim, o que lamento. Quanto mais essa imagem fica ruim, isso mais afugenta pessoas de bem e profissionais gabaritados. O exercício dos cargos públicos, especialmente no Executivo, tem muito mais ônus do que bônus. Tem um peso enorme de responsabilidade que assusta e espanta as pessoas, associado a uma remuneração muito baixa [de R$ 10,5 mil para o governador em MG]. É um salário muito baixo, um dos mais baixos do Brasil.

O sr. foi o condutor da parte administrativa tanto no governo Aécio como na atual gestão. Com a sua saída, teme o abandono desse modelo?
Desperdiçar uma equipe técnica, de alta qualidade, com novos padrões de performance, com resultados, com métodos, com o número de informações que fizemos, posso estar equivocado, mas acho muito difícil que qualquer pessoa em sã consciência e de mentalidade normal, que não tenha algum tipo de distúrbio, vá abrir mão disso, de qualquer partido que seja.

Na segurança, em 2005, a taxa média mensal de crimes violentos no Estado era de 45 por 100 mil habitantes e teve uma queda para 20,8 em 2010. No mês passado, porém, a taxa foi a 39,3. O que aconteceu?
É difícil identificar uma causa. Temos a questão das drogas. Tivemos diminuição no fluxo de acréscimo de efetivos das polícias, especialmente na PM. A partir de 2011, com a política remuneratória em que foram dados aumentos expressivos, houve opção: ou dá aumento [no salário] ou aumenta o efetivo. E a população cresceu. Passamos a ter esse sentimento de violência, não é uma coisa isolada de Minas. É evidente que temos um problema grave. A segurança é sem dúvida alguma o grande gargalo.

Quais as suas maiores frustrações como governador?
Não vou dizer que é uma frustração. A segurança, de fato, nos decepciona a todos. E nos quatro anos desse mandato, tivemos período muito adverso em termo de recursos. O Brasil virou completamente. O ambiente de crescimento contínuo não aconteceu mais. Isso nos desgasta.

E o que deve ser celebrado?
Os resultados na educação. Conseguimos coisas muito expressivas. Um Estado que é muito desigual, com regiões ainda muito pouco desenvolvidas, conseguir manter o Ideb [liderança] nos últimos dois anos, conseguir sete vitórias consecutivas nas olimpíadas de matemática, as melhores notas da Prova Brasil de todo o sistema da educação, é muito positivo.

Depender da riqueza gerada pela mineração e agropecuária é uma 'maldição' de Minas? No que as duas gestões tucanas falharam ao não conseguir que o Estado avançasse de forma mais acelerada para mudar esse perfil?
Não fracassamos. Ao contrário. Iniciamos esse processo que vai levar 20, 30 anos, porque temos que mudar o perfil da economia mineira. Não é uma maldição. O fato de termos a mineração e a agropecuária é uma bênção. Isso nos dá emprego, prosperidade, renda. O que não podemos ficar é dependentes exclusivamente. Temos que agregar valor melhorando a cadeia produtiva desses produtos. E, ao mesmo tempo, desenvolver a nova economia, áreas de defesa, biotecnologia e semicondutores. Iniciamos um processo.

Como o sr. avalia o governo da presidente Dilma?
Tenho uma relação pessoal de respeito com a presidente. Digo sempre: governo não é aquele que queremos --tanto o meu quanto o dela--, é o que nós podemos. O que se nota da administração federal, e não vem do governo dela, sejamos justos, e nem do anterior, já vem de 40 anos atrás, é uma administração muito centralizada. Como é centralizada, fica emperrada. Temos de ter, em algum momento, um presidente, espero que seja o Aécio, que tenha a grandeza de descentralizar, de abrir mão de poder e passar para Estados e municípios a competência de fazer. O governo federal padece desse mesmo mal que vem dos governos militares e vem repetindo, passado por todos os governos, inclusive do PSDB. É um processo muito grave de centralização. Temos de ter uma federação verdadeira no Brasil.

Nas manifestações de junho, o sr. temeu pelo pior?
O pior aconteceu. Duas pessoas faleceram porque caíram [de um viaduto]. Tivemos patrimônio depredado, cenas bárbaras, tensão.

Que lição o sr. vai levar das manifestações?
A primeira é que sempre prevalece o imponderável, coisas que a gente não pode imaginar. A Copa das Confederações foi imaginada no mínimo detalhe, mas o imponderável surge, de maneira lícita, legítima, da manifestação. O segundo é que devemos ter sempre diálogo.

O ex-ministro Pimenta da Veiga será o candidato ao governo de Minas pelo PSDB?
É uma pergunta que não tem resposta. Se afunilam dois nomes pelo nosso partido: o do Pimenta e o do deputado Marcus Pestana.

O sr. acha que o julgamento do mensalão tucano pode prejudicar o PSDB nas disputas eleitorais de 2014?
Hoje [quarta-feira] mesmo lia nos jornais que o homem médio não se incomoda com isso, sob o ponto de vista de escolher o seu candidato. Não vi efeito do julgamento do mensalão nas eleições municipais. Em um determinado público atinge, porque são comportamentos julgados e condenados como criminosos. Do ponto de vista eleitoral não vai funcionar. A questão que aconteceu aqui em Minas, na eleição do [ex-] governador Eduardo Azeredo [atualmente deputado federal], me parece muito distinta. Usam o nome mensalão, mas não é isso que se relata no inquérito no Supremo Tribunal Federal. As pessoas vão perceber o desdobramento muito diferente nos dois casos.

Do que o sr. mais vai sentir falta quando deixar o governo?
Eu acho que é mais alívio do que falta. Eu vou sentir falta do convívio com tanta gente, vou sentir falta de ir ao interior. Gosto de ir ao interior e conversar com as pessoas. Estudo um pouco a história da cidade e gosto de ir onde um governador nunca foi.

E do que sentirá menos falta?
Da quantidade de compromissos, especialmente compromissos à noite, que são numerosos. Isso cansa demais, são compromissos protocolares, você tem que ir. Mas isso desgasta muito. Outra coisa que desgasta muito é a incompreensão das pessoas. As pessoas imaginam equivocadamente que o governador, o prefeito, o presidente pode muito. Não é verdade. As pessoas não compreendem isso e fazem os pedidos mais impossíveis do mundo. Eu não tenho muito estilo ou a paciência de falar com a pessoa que vou tentar [realizar esse pedido]. Isso desgasta porque as pessoas ficam assustadas.


Endereço da página: