Folha de S. Paulo


editorial

Imposto kafkiano

Em boa hora, o Supremo Tribunal Federal suspendeu provisoriamente a validade de parte de uma norma que alterou o modo de pagamento do ICMS. O regulamento vinha atazanando, em particular, micro e pequenas empresas dedicadas ao comércio eletrônico.

Conforme entendimento dos secretários estaduais de Fazenda, tais empreendimentos deveriam se adequar à determinação, aprovada em 2015 pelo Congresso, de que o imposto devido nas transações de venda pela internet seja partilhado entre o Estado de origem e o de destino das mercadorias.

Com isso, as empresas inscritas no Simples, que em circunstâncias normais apenas recolhem ao fisco uma parcela fixa de sua receita, tiveram de gastar tempo e dinheiro em uma rotina kafkiana de impressão de múltiplas guias de pagamento e consulta às tabelas de alíquotas do ICMS, que variam de Estado para Estado.

Por pequeno que pareça, o episódio é ilustrativo da instabilidade legal e do inferno burocrático que caracterizam o sistema tributário brasileiro, líder mundial em tarefas exigidas dos contribuintes –para nada falar da carga equivalente a mais de um terço da renda nacional, extravagante para um país emergente.

Tributo de maior arrecadação do país e principal fonte de receita dos Estados, o ICMS é alvo contumaz de propostas de reforma que se acumulam há décadas nos escaninhos do Congresso.

A complexidade desse e de outros impostos e contribuições sociais impõe o custo da criação de departamentos grandes de administração tributária. Energias empresariais se voltam à faina de reivindicação de regimes especiais nos lobbies brasilienses.

A alocação do capital é distorcida pelos favores concedidos por União, Estados e municípios: benesses estatais, não as condições de mercado, acabam por reger decisões de investimento. Estímulos fiscais dos tempos de bonança precisam ser revertidos em tempos de vacas magras como os atuais.

Nesse edifício precário e insalubre de puxadinhos legais ampara-se o sistema tributário brasileiro, causa de ineficiência e de atraso. Dadas a penúria orçamentária, a pequenez e a falta de visão dos governantes, tão cedo não vai se dar cabo dessa barafunda.

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