Folha de S. Paulo


Emmanuel Publio Dias: Avaliação do governo e intenções de voto

Por mais que os defensores e estrategistas do Planalto tentem desqualificar as manifestações do último domingo como um "panelaço das elites", o comportamento dos brasileiros vem seguindo um comportamento previsível em relação à forma como avaliam o governo federal e o desempenho dos diversos presidentes nos últimos 20 anos: situação econômica e expectativas positivas, aprovação e voto.

Dificuldades econômicas que restrinjam o salário, poder de compra e emprego (ou a mera expectativa dessas dificuldades) resultam em desaprovação e voto na oposição.

É natural que as classes médias urbanas sintam e manifestem antes suas restrições ao governo, principalmente quando lhes pesam no bolso. Mas, desta vez, a insatisfação dos brasileiros já havia sido detectada pelo Datafolha em fevereiro: o índice de avaliação da presidente Dilma –índice que é o resultado das avaliações "ótimo e bom" menos "ruim e péssimo"– registrou uma inversão: de 18 pontos positivos para 21 pontos negativos.

Uma perda de 39 pontos em dois meses, repetindo 2013, quando a avaliação da presidente caiu dos 50 pontos herdados de Lula para 5 pontos pós-manifestações de junho de 2013, oscilando a níveis quase negativos durante a Copa do Mundo.

A evolução dos índices de aprovação dos governos Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma permite elaborar uma hipótese sobre a relação entre a oferta de "bens econômicos e sociais" e as avaliações dos governos e, depois, a manifestação do voto, mostrando que o eleitorado brasileiro aprendeu e pratica a política do "toma lá dá cá".

FHC elegeu-se no primeiro turno em 1994 a bordo do Plano Real, com índices acima dos 30 pontos, imediatamente antes do pleito.

À medida que aumentaram as dificuldades econômicas, o índice do 1º governo FHC caiu a 6 pontos, levando a equipe econômica do PSDB a procedimentos heterodoxos e criativos, mudando a percepção dos eleitores, elevando a aprovação para 30 pontos em setembro. Em outubro, FHC seria reeleito no primeiro turno com 53% de votos válidos.

Um mês após eleito, revertidas as medidas que mantinham a economia artificialmente aquecida, FHC teria índice de avaliação de 43 pontos negativos, recorde nas pesquisas do Datafolha, facilitando para o eleitorado aceitar a proposta de Lula e um governo petista, opção antes rechaçada pelos brasileiros.

Lula começou seu primeiro mandato com índice de 33 pontos positivos. Manteve-se assim até o escândalo do mensalão, quando a percepção positiva começou a cair, até zerar, no final de 2005.

Em 2006, os brasileiros entenderam que os benefícios percebidos na administração petista eram mais importantes que os desvios éticos comprovados, o que resultou em sua relativamente fácil reeleição.

No segundo mandato de Lula, as conquistas econômicas e os programas de assistência deram aos brasileiros a certeza de que, enfim, haviam "chegado lá" e que o melhor a fazer era eleger o candidato da situação. Dilma não só foi eleita como iniciou seu primeiro mandato com 40 pontos positivos, elevando-os depois para mais de 50 pontos.

Após as manifestações de junho de 2013 e à medida que a situação econômica se deteriorava, a avaliação do governo federal praticamente zerou os índices positivos e, por muito pouco, o PT não perdeu a eleição. Só não perdeu porque a campanha eleitoral, principalmente na TV, permitiu ao PT retomar o discurso e a agenda positiva, fazendo com que a avaliação do governo crescesse quase 20 pontos, atingindo o ápice exatamente no dia da eleição, garantindo a vitória. Esse foi, efetivamente, o mais importante fator de reversão das tendências eleitorais que estavam desenhadas.

Em 2015, as percepções reais se deterioraram, assim como as expectativas. Surge uma agenda pessimista e negativa, turbinada pela operação Lava Jato. O panelaço e a convocatória de protestos no domingo confirma o Datafolha de fevereiro e antecipa resultados ainda mais amargos na próxima medição.

EMMANUEL PUBLIO DIAS, 63, é especialista em marketing político e professor na Escola Superior de Propaganda e Marketing

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