Folha de S. Paulo


Editorial: Melhora o clima

O acordo sobre mudança climática anunciado por EUA e China representa uma injeção de ânimo na cambaleante negociação internacional sobre o tema capitaneada pela ONU. Mais pelo aspecto diplomático e político do que pela redução efetiva de emissões de gases do efeito estufa que trará, mas ainda assim um passo decisivo.

A China promete desacelerar o aumento de suas emissões de forma paulatina até estabilizá-las e começar a diminuí-las em 2030, ou antes. Pela primeira vez o país asiático, hoje o maior poluidor do planeta, admite metas quantitativas.

Os EUA, que já haviam assumido o compromisso de reduzir emissões em 17% até 2020, na comparação com 2005, agora adotam o objetivo de cortar de 26% a 28% até 2025.

As duas promessas ainda ficam muito distantes do que é necessário para evitar que a atmosfera terrestre esquente mais de 2°C neste século –nível de aquecimento tido como arriscado devido aos eventos extremos que poderia desencadear (como secas e enchentes mais graves e frequentes do que hoje).

O primeiro impacto do anúncio será sobre a próxima conferência anual, em Lima, no mês que vem. Tudo se encaminhava para mais uma reunião burocrática, centrada em procedimentos; o acordo sino-americano, todavia, impõe aos demais países o desafio de ao menos delinear compromissos à altura.

O tratado internacional para combater o aquecimento global que vai substituir o malfadado Protocolo de Kyoto será concluído (ou não) apenas um ano depois, em Paris. Essa será a prova dos nove –menos mal, portanto, que um dos tradicionais obstáculos se ache agora removido.

A queda de braço entre China e EUA, cujas emissões somadas equivalem a cerca de 40% do total mundial, esteve na origem do fracasso de muitas cúpulas, como a de 2009 em Copenhague. Que tenham superado diferenças em nove meses de tratativas bilaterais secretas constitui sinal auspicioso.

O acerto, ademais, fragiliza um importante argumento nacionalista usado pela ala do Congresso americano contrária a um tratado climático. A maioria do Partido Republicano, que agora se impôs também no Senado, certamente recusaria ratificar qualquer convenção que não atribuísse obrigações à China, como ocorreu com Kyoto.

Finalmente, o acordo deixa o Brasil em posição menos confortável no teatro das negociações.

O país sempre se alinhou com a China para arrancar mais compromissos dos países desenvolvidos, como os EUA, e não conta mais com o trunfo do dramático corte de suas emissões pela redução das taxas de desmatamento (que agora ensaiam um repique).

Para continuar no rol dos protagonistas, terá de fazer melhor que apenas reiterar as metas voluntárias já adotadas.


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