Folha de S. Paulo


Terence Trennepohl: Hidrelétricas em áreas de proteção ambiental

A realização de novos estudos de viabilidade econômica e ambiental para empreendimentos hidrelétricos em unidades de conservação, como em áreas protegidas da Amazônia, ganhou fôlego recentemente com a opinião divergente de dois importantes representantes de setores do governo: Mauricio Tolmasquim, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), entidade vinculada ao Ministério de Minas e Energia, e a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira.

Em entrevista ao jornal "Valor Econômico", Tolmasquim disse ser favorável à realização desses estudos por serem importantes para "analisar os benefícios, custos e impactos para tomar decisões mais profundas". Os argumentos do dirigente da EPE foram ardorosamente rebatidos pela ministra dias depois, no mesmo espaço. Izabella disse, entre outras coisas, que estudos nessa região não são viáveis.

Deixando o debate de lado, a necessidade de expandir o parque de geração de energia e de preservar a natureza é assunto que deve ser analisado sob a ótica da legislação vigente.

A lei nº. 9.985, de 2000, que criou o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) tem como objetivos principais "promover o desenvolvimento sustentável a partir dos recursos naturais" e "promover a utilização dos princípios e práticas de conservação da natureza no processo de desenvolvimento" (art. 4º).

O mesmo artigo diz que as unidades de conservação, criadas por decreto presidencial ou lei, podem ter seus limites reduzidos, ou até áreas inteiras excluídas, por meio de legislação específica.

Um exemplo disso foi a alteração, instituída pela lei nº. 12.678, de 2012, dos limites de várias áreas, como o entorno dos reservatórios das usinas Santo Antônio e Jirau, ambas no Rio Madeira.

Para isso, no entanto, são necessários estudos preliminares até mesmo para avaliar a relação entre o custo ambiental do empreendimento e sua contribuição na geração de energia para o país.

Essas avaliações iniciais podem concluir se a ação causará prejuízos irremediáveis aos recursos naturais e se os custos ambientais, sociais e políticos poderão ser compensados pela quantidade de energia produzida pela hidrelétrica. Ou, ainda, que a área a ser "desafetada" pode ser compensada com vantagens pela inclusão de outras áreas não atingidas pela atividade e pela exploração do potencial hídrico.

Qualquer planejamento consistente de aproveitamento de recursos hídricos deve ser precedido de estudos que contemplem todos os aspectos envolvidos, assim como qualquer proposta de alteração das áreas protegidas.

A falta desses estudos pode levar a propostas de alteração de limites de unidades de conservação que não resultarão, no futuro, em efetiva instalação de hidrelétricas. Ou, ainda, em construções de usinas a custos elevados e com menor eficiência de geração de energia.

Não existe, na legislação ambiental, impedimento para autorizar esses estudos com as condições e cautelas necessárias. Proibir os estudos de viabilidade representa impedir que essas áreas sejam "desafetadas", ou mesmo obrigar o Executivo a encaminhar projetos de lei ao Legislativo com fundamentação incompleta, podendo levar a decisões equivocadas ou a intermináveis questionamentos judiciais futuros.

Portanto, respeitadas as opiniões divergentes de altos executivos do poder público federal, coerentes com suas respectivas áreas, entendemos que o melhor é seguir o que a lei prevê em busca de decisões mais racionais e menos emotivas em prol do desenvolvimento sustentável.

TERENCE TRENNEPOHL, 37, advogado com pós-doutorado pela Universidade de Harvard (Estados Unidos), é sócio do escritório Campos Mello Advogados

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