Folha de S. Paulo


Michelle Obama critica Trump por 'bullying' e pede união a democratas

Quão popular é Michelle Obama?

Se a ovação do público servir de parâmetro, a primeira-dama parece ser uma unanimidade capaz de silenciar até barulhentos partidários de Bernie Sanders.

Sobraram indiretas para Donald Trump, mas também para democratas inconformados com a derrota de Sanders nas prévias da legenda, no discurso da primeira-dama, um mais eletrizantes desta segunda (25), primeira noite da Convenção Nacional Democrata.

Joe Raedle/Getty Images/AFP
A primeira-dama dos EUA, Michelle Obama, discursa na Convenção do Partido Democrata na segunda
A primeira-dama dos EUA, Michelle Obama, discursa na Convenção do Partido Democrata na segunda

Ela não precisou citar o presidenciável republicano para que a plateia recebesse o recado.

"Os desafios que um presidente enfrenta não são preto ou branco e não podem ser reduzidos a 140 caracteres", disse, alfinetando Trump, o tuiteiro frenético.

Quem suceder seu marido na Casa Branca comandará as Forças Armadas e os botões do arsenal nuclear, afirmou Michelle, em novo sopapo em Trump, o impulsivo e inexperiente rival.

Ela também se referiu a uma característica associada ao magnata: fazer "bullying" contra seus desafetos. "Quando eles descem [o nível], nós ascendemos."

Mulher do primeiro presidente negro americano, Michelle buscou apaziguar as tensões raciais que assolam o país após ataques contra policiais e uma sucessão de negros mortos sem aparente necessidade por agentes brancos.

A primeira-dama pediu união entre agentes e manifestantes de movimentos como Black Lives Matter.

Lembrou, em seguida, que todo dia acorda "num lar construído por escravos", a Casa Branca —onde agora moram suas "duas filhas lindas e negras".

HILLARY

Ela teve rusgas com Hillary em 2008, após um embate virulento entre a ex-senadora de Nova York e Barack Obama nas primárias que escolheram Barack Obama como presidenciável da vez.

Publicamente, ao menos, a rixa ficou no passado.

Michelle fez várias concessões a Hillary e disse que, graças a ela, "minhas filhas partem do princípio de que uma mulher pode concorrer à Presidência dos Estados Unidos".

Ressaltou ainda que, naquelas prévias, a ex-primeira dama não demorou para apoiar Obama (Sanders levou semanas para endossar a adversária).

"Quando ela perdeu a eleição oito anos atrás, não ficou com raiva ou desiludida. Não fez as malas e foi pra casa."

A carapuça coube a partidários do senador Sanders, que passaram a noite vaiando menções à ex-secretária de Estado e gritando "Bernie! Bernie!".

Quando Michelle falou, contudo, a oposição foi tímida.

A Wells Fargo Arena, que abriga a convenção, ficou colorida de roxo por vários minutos. Era a cor de bastões com o nome de Michelle, distribuídos à audiência antes de seu discurso.

A fala foi precedida por um vídeo produzido por J.J. Abrams ("Star Wars"), em que várias crianças versavam sobre a primeira-dama.

Minutos depois, Michelle lembrou que certa vez um garotinho negro olhou assustado para Obama e perguntou se o cabelo dele era igual ao do presidente.

O momento foi capturado por um fotógrafo e virou um clássico retrato da era Obama: o presidente abaixado enquanto a criança toca sua cabeça.

DÉJÀ VU

Uma semana antes, a primeira-dama foi coadjuvante involuntária da convenção republicana.

A mulher de Donald Trump, a ex-modelo Melania, leu um discurso com frases sobre "valores" que Michelle já havia dito oito anos atrás, quando Obama disputava a eleição contra John McCain.

A atual titular do cargo não comentou o plágio, assumido depois por uma redatora e amiga da família Trump. A fala original, de 2008, remete a uma noite decisiva na carreira política de Obama.

Mas não é só seu marido que tem um legado a zelar depois de entregar as chaves do número 1.600 da avenida Pensilvânia. Mesmo fora de uma arena tão favorável, Michelle continua em alta.

Em 2014, ela era bem-vista por 69% dos americanos, na média dos primeiros cinco anos no posto, segundo o Centro de Pesquisa Pew (não há medições mais recentes).

Saiu-se melhor que as antecessoras Laura Bush (65%) e Hillary Clinton (55%), que moraram, como Michelle, por oito anos na Casa Branca.

Como primeira-dama, ela escolheu seus campos de batalha. Umas das principais bandeiras foi contra a obesidade infantil, como patrona do programa Let's Move (vamos nos mexer).

Bateu de frente com o império do fast food e mais de uma vez executou coreografias em público ("fiz papel de boba") para estimular a criançada a fazer exercícios físicos.

Teve de enfrentar o estereótipo da "mulher negra zangada", rótulo comumente usado para desmerecer causas das afro-americanas.

A descrição foi aplicada a Michelle em 2008, por Bill O'Reilly, apresentador da Fox News, emissora de credenciais conservadoras.

Até seu guarda-roupa causou discórdia. Em sua primeira foto oficial como primeira-dama, ela escolheu um tubinho preto sem mangas, deixando à mostra seus braços bem torneados.

Conservadores viram ali uma quebra de decoro imperdoável para o posto —Jackie Kennedy cometera o mesmo "pecado" em 1963, no discurso anual do marido, JFK, no Congresso.


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