Folha de S. Paulo


Como uma eventual saída do Reino Unido da UE afetaria a América Latina

Às vésperas do plebiscito que deve decidir o futuro do Reino Unido na União Europeia (UE), o mundo aguarda com grande expectativa o desfecho da votação.

Também na América Latina teme-se que um "Brexit" (saída do Reino Unido da UE) tenha consequências.

Em primeiro lugar, os acordos de livre-comércio vigentes entre o bloco europeu e México, Chile, Peru e Colômbia deixariam de valer no Reino Unido. Ou seja, os britânicos não teriam mais nenhum tratado comercial com países latino-americanos.

Gareth Fuller/AFP
Premiê britânico, David Cameron, com xícara que diz
Premiê britânico, David Cameron, com xícara que diz "estou dentro", em alusão ao plebiscito que irá decidir pela permanência do Reino Unido na União Europeia

Como negociações comerciais costumam se estender por muito tempo, no curto prazo, as trocas com os países da América Latina poderiam diminuir.

No longo prazo, a negociação de acordos com cada país poderia ser mais difícil do que com a UE como bloco. Por outro lado, os governos latino-americanos poderiam exigir do Reino Unido mais concessões do que as que conseguiriam obter da União Europeia.

OS DOIS LADOS DO 'BREXIT'

Nos países com os quais o bloco europeu não tem acordos comerciais, incluindo Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, um "Brexit" poderia ter efeito no caso de uma desvalorização da libra em relação ao dólar, prevista por economistas e que poderia baratear as exportações britânicas.

Por outro lado, nos muitos países latino-americanos que desvalorizaram suas moedas frente ao dólar, o efeito seria menor.

COMÉRCIO EXTERIOR

Outro aspecto importante das relações comerciais entre Reino Unido e América Latina são os volumes em jogo, independentemente da existência ou não de tratados de livre-comércio com a União Europeia.

Peguemos como exemplo as duas maiores economias latino-americanas, Brasil e México.

Para o Brasil, com quem a UE não tem acordo de livre-comércio, por exemplo, o Reino Unido exporta US$ 4 bilhões em bens e serviços por ano, e importa outros US$ 4,2 bilhões.

Antes da crise, em 2014, as exportações totais do Brasil somaram US$ 225 bilhões, e as importações, US$ 229 bilhões. Isso significa que a participação do Reino Unido nas exportações brasileiras é de apenas 1,6%, e nas exportações, de 1,8%.

Niklas Halle'n/AFP
Boatsd decorated with flags and banners from the 'Fishing for Leave' group that are campaigning for a 'leave' vote in the EU referendum sail by the British Houses of Parliament as part of a
Barcos no rio Tâmisa, em Londres, com placas da campanha pela saída britânica da UE

Já para o México, com quem a UE tem acordo de livre comércio, o Reino Unido exporta cerca de US$ 2,2 bilhões por ano em bens e serviços, e os importa do México por cerca de US$ 1,8 bilhão.

Em 2014, as exportações totais do país americano somaram US$ 410 bilhões, e as importações, US$ 400 bilhões. Ou seja, a participação do Reino Unido nas importações mexicanas é de apenas 0,5%. Como destino das exportações mexicanas, a participação britânica é ainda menor, de 0,4%.

A parcela representada pelo Reino Unido no comércio exterior com esses dois países é, portanto, pequena, e, por isso, um "Brexit" passaria praticamente despercebido nas duas grandes economias latino-americanas.

Nos demais países da região, os volumes de exportação e importação britânicos são ainda menores.

NOVAS PRIORIDADES

Para evitar alterações nos fluxos comerciais hoje decisivos para a economia britânica, o Reino Unido deverá negociar acordos com a UE e com países não pertencentes ao bloco, como Estados Unidos, Índia, China, Japão e Austrália.

É provável que essas negociações tenham prioridade para o Reino Unido, e não a América Latina. Isso porque mais da metade do comércio britânico é realizado com a UE, e o comércio com outros 60 países está regulamentado por acordos fechados por meio do bloco europeu.

Fato é que, dado o volume pequeno de comércio entre o Reino Unido e os países latino-americanos, é improvável que estes fiquem mais relevantes para os britânicos no caso de um "Brexit".

Afinal, os tempos em que o Reino Unido tinha um grande peso econômico na América Latina ficaram há muito tempo no passado.

O destino do Reino Unido


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