Folha de S. Paulo


Dono de crucifixo 'comunista' defende escultura entregue por Evo a Francisco

Dono do crucifixo em formato de foice e martelo cuja réplica foi presenteada ao papa Francisco pelo presidente boliviano, Evo Morales na última quarta (8), o padre jesuíta e sociólogo Xavier Albó, 80, disse que a escultura apenas representa o diálogo.

Ele negou que o autor da peça, o também padre jesuíta e amigo Luis Espinal, assassinado em março de 1980, fosse comunista.

"Era uma chamada para dizer que temos de dialogar com todos, mesmo com os não crentes", afirmou à Folha.

"Ele [Espinal] coincidia em muitas coisas com o marxismo, como transformar a sociedade, mas na parte metafísica estava totalmente em desacordo com o ateísmo."

Espinal, de origem catalã como Albó, foi assassinado durante a ditadura militar boliviana (1964-1982). Ligado à Teologia da Libertação, era próximo de movimentos indígenas e criticava abertamente o regime da época.

Na chegada a La Paz, na quarta-feira, Francisco, também jesuíta, parou o papamóvel perto do local onde Espinal foi morto e pediu um minuto de silêncio em sua homenagem. Pouco depois, o pontífice recebeu a escultura de Evo.

Em resposta à onda de críticas de que Evo teria entregue um "crucifixo comunista" para constranger Francisco, o Vaticano disse que não houve ofensa no gesto.

"Você pode discutir o significado e o uso do símbolo hoje, mas ele foi criado por Espinal, e o seu sentido era sobre um diálogo aberto, não sobre alguma ideologia específica", declarou o porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi.

PAPA DOS POBRES

O governo boliviano disse que o presente não representa um gesto político, mas é um símbolo que, na visão de Evo Morales, agradaria ao "papa dos pobres".

"[O presente] representou um grande afeto. [Trata-se] de uma obra desenhada pelas mãos de Luis Espinal", disse a ministra das Comunicações, Manianela Paco.

Albó, que dividia um quarto com o padre jesuíta quando ele foi morto, disse que ficou com a escultura como herdeiro legítimo. "Continuarei com a escultura original e não penso em soltá-la. Nem que o papa me peça."


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