Folha de S. Paulo


Clubes de maconha crescem na Espanha com leis ultrapassadas

Samuel Aranda - 26.mai.2014/The New York Times
A maconha usado em um clube em Barcelona, na Espanha
A maconha usado em um clube em Barcelona, na Espanha

Numa noite recente, dois universitários alemães em férias em Barcelona, tendo em mãos alguns endereços conseguidos na internet, tentaram entrar em um dos novos clubes de maconha da cidade.

Eles não eram sócios, mas isso não foi problema. Não demoraram a encontrar um clube perto da avenida central da cidade, La Rambla, que se dispôs a ignorar as regras, ajudando-os a escolher entre uma dúzia de variedades de maconha à venda em barris de plástico e então deixando que se acomodassem no salão do clube para fumar.

Quarenta e cinco minutos depois, os dois alemães estavam na rua outra vez, sorridentes. "Foi muito agradável", comentou um deles, que tinha pesquisado os clubes de maconha antes de escolher Barcelona como seu destino de férias. "Vamos voltar amanhã."

O número de clubes de maconha abertos recentemente em Barcelona leva alguns especialistas a prever que a cidade não vai demorar a rivalizar com Amsterdã como maior destino de turistas interessados em fumar um cigarro de maconha em paz.

Enquanto Amsterdã vem combatendo o turismo de drogas nos últimos anos, reduzindo o número de coffee shops onde a compra e o fumo de maconha e haxixe são permitidos por lei, cerca de 300 novos clubes de maconha foram abertos em Barcelona e região vizinha. Para especialistas, o fato se deve principalmente a espanhóis empreendedores que buscam novas maneiras de ganhar a vida.

Não é que as autoridades de Barcelona tenham abençoado este fenômeno novo. Os clubes operam graças a leis espanholas vigentes há décadas que permitem que qualquer pessoa cultive e fume maconha sozinha ou que pessoas se unam para criar um clube de maconha, desde que seja uma organização sem fins lucrativas e restrita a seus sócios, um pouco como um clube de culinária ou xadrez.

Nos últimos três anos, porém, foram abertos novos clubes, especialmente em áreas turísticas como La Rambla, em muitos casos desrespeitando o espírito da lei, quando não o texto dela. Alguns dos clubes recusam fregueses ocasionais, como os dois universitários alemães, mas muitos deles aceitam novos sócios pela internet ou pelo telefone mediante o pagamento de cerca de €20 (US$27).

Os clubes variam muito, abrangendo desde salas em subsolos com mesas de pebolim e televisores enormes até ambientes mais refinados, com luminárias de grife e bares que servem sucos de frutas feitos na hora. Alguns dão a maconha de graça a pessoas que a usam para finalidades médicas e enxergam um negócio nessa área. Outros atendem apenas usuários recreativos. Poucos dos clubes chamam a atenção desde a rua.

O Rambla Dragon Club, por exemplo, aberto no ano passado, fica no térreo de um edifício residencial. Apenas uma placa pequena sobre a campainha trai sua existência, além da presença constante de jovens procurando decifrá-la. O ambiente lembra um Starbucks sem janelas; o pé direito alto e um sistema de ventilação poderoso garantem a circulação de ar. Alguns dos fumantes ficam sentados diante de mesas, com seus laptops abertos à sua frente. Outros se espalham sobre sofás, assistindo a filmes num telão.

Para alguns defensores da maconha, os clubes são um sinal animador na economia. Apesar de não terem fins lucrativos, seus defensores dizem que os clubes estão gerando milhares de empregos e receita tributária para o Estado. Além de oferecer uma seleção grande de produtos à base de maconha e haxixe, muitos deles vendem comida e bebida e oferecem atrações extras a seus sócios, como música ao vivo e aulas de Pilates.

Albert Tió é o presidente da FEDCAC, a associações de clubes de maconha na região da Catalunha que abrange Barcelona. Ele disse que cinco anos atrás os clubes praticamente não tinham sócios, mas hoje já contam com 165 mil. Sua associação foi formada em 2011, quando existiam poucos clubes.

Outra razão do crescimento, segundo ele, foi que muitos jovens enxergam os clubes como maneiras de ganhar a vida. Ainda outro fator seriam as novas leis de Barcelona que proíbem o cigarro, que entraram em vigor em bares e restaurantes em janeiro de 2011 e levaram os fumantes de maconha, que em muitos casos também fumam tabaco, a procurar espaços novos nos quais se reunir.

"A realidade", disse Tió, "é que os consumidores acham isto aqui melhor do que comprar drogas na rua."

As autoridades regionais dizem que muitos dos clubes realmente atendem a uma clientela principalmente espanhola. Um deles tem apenas sócias mulheres, na casa dos 80 anos. Mas as autoridades de Barcelona estão preocupadas com a ascensão rápida desses estabelecimentos e com o fato de a cidade estar ganhando reputação crescente como lugar onde é possível ficar chapado legalmente. Em junho, decidiram suspender a concessão de novas licenças por um ano, enquanto são analisadas questões como a proximidade dos clubes com escolas.

"Sim, é um problema", falou Joan Delort, chefe de prevenção, segurança e mobilidade em Barcelona. "Em muito poucos anos tivemos um aumento enorme no cadastramento de usuários de maconha. É muito difícil determinar o que está acontecendo de fato. Mas no prazo de 18 meses vimos clubes que ocupam um espaço muito pequeno receberem 4.000 sócios. É impossível que tenham tantos assim."


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