Folha de S. Paulo


Para analistas, Brasil não impôs seu estilo no Haiti

O saldo dos dez anos do Brasil no comando militar da Minustah (missão de paz no Haiti) tem aspectos positivos e negativos, segundo analistas. O país criou uma boa relação com a ONU e aperfeiçoou as tropas, mas não conseguiu alavancar a campanha por uma vaga permanente no Conselho de Segurança.

"Havia uma expectativa de que o Brasil pudesse implantar uma forma distinta de comandar, entre a construção e a imposição da paz, combatendo os problemas socioeconômicos e os de segurança", diz Ricardo Seitenfus, representante da OEA no Haiti entre 2009 e 2011.

Ele acredita que as principais potências impediram o Brasil de realizar o objetivo. "Era um sonho brasileiro. Um embate que o Brasil fez com os sócios mais próximos e no âmbito do Conselho de Segurança, que resultou na derrota brasileira e da nossa experiência no Haiti", explicou.

Segundo o alemão Kai Michael Kenkel, especialista em operações de paz, o Brasil trouxe benefícios à população haitiana. "O país foi bem visto internacionalmente. Conseguiu casar um jeito brasileiro de fazer as coisas com experiências domésticas", disse. Na área militar, porém, afirma que é difícil sair das práticas estabelecidas pela ONU em missões de paz.

"Talvez o Brasil tivesse a expectativa de que [a participação] fosse traduzida em perfil internacional. Mas o fato de liderar já foi grande satisfação.", afirmou ele. Após o Haiti, o país foi convidado para comandar missões no Congo e no Líbano.

"Isso reflete um reconhecimento por parte da ONU em relação à qualidade e à importância da contribuição brasileira", diz Danilo Souza Neto, que estudou a Minustah em seu mestrado e é doutorando na Universidade de Cambridge.

Já o antropólogo Omar Ribeiro Thomaz, da Unicamp, especialista no Haiti, considera um equívoco a propaganda de gentileza da atuação no Haiti.

"Não teve nada de excepcional. O Brasil agiu de acordo com o protocolo da ONU, tentou ganhar prestígio internacional e não conseguiu, continua sendo um país amador", afirmou.

Mais de 30 mil militares do Exército, Marinha e Aeronáutica passaram pelo Haiti o que fez da Minustah a maior operação militar brasileira desde a Guerra do Paraguai.

Para muitos deles, foi a primeira atividade real em campo. "Esse treinamento vem sendo muito útil para que, no seu retorno ao país, nossas tropas possam incorporar a experiência em território brasileiro", afirmou o Itamaraty. O Haiti rendeu ao país, por exemplo, a experiência de pacificações de favelas, depois aplicada no Rio.

O Ministério da Defesa diz também que passou a ter acesso a novas tecnologias e estratégias usadas em ações com ou sem o uso de força.

Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress

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