Folha de S. Paulo


'Rastro digital' barra acesso a EUA e Canadá

Informações, dinheiro e trabalho se deslocam facilmente pelo mundo. Mas pessoas estão tendo mais dificuldade para atravessar algumas fronteiras.

À medida que políticas imigratórias são endurecidas e que aumentam a segurança e a tecnologia, os viajantes podem enredar-se numa teia de suspeitas que os impede de viajar a alguns países.

Uma detenção ou condenação anterior –até mesmo a simples admissão pública de ter cometido uma atividade ilegal– pode ser motivo para a inadmissibilidade.

O mesmo se aplica ao ativismo político ou à impressão de que um passageiro está visitando um país a negócios sem visto de trabalho.

Um telefone celular atrapalhou o músico Jake Owen, de Nova York, quando ele viajou de avião ao Canadá no ano passado para tocar num café. Foi barrado no aeroporto de Vancouver e detido por várias horas enquanto era interrogado sobre a finalidade de sua viagem.

"Ele perguntou: 'Você vai trabalhar durante sua permanência aqui?'", Owen recordou. "Eu falei: 'Tenho um show no café, mas é sem cachê'. Ele disse, muito ameaçador, 'sabe que você precisa de autorização para trabalhar aqui'. Pegou meu telefone imediatamente. Eu não sabia que ele tinha o direito de fazer isso", lembra o músico.

Owen disse que o policial encontrou em seu telefone uma mensagem que sugeria que ele seria pago pelo amigo com quem iria tocar, um cantor dinamarquês, e não pelo café. Foi o bastante para que fosse posto num avião de volta aos EUA.

"Eu estava numa sala grande de interrogatório, com mesas de aço. Era um lugar realmente frio, e o sujeito estava agindo como se tivesse me flagrado cometendo algum crime, dizendo que poderia me proibir de entrar no Canadá para sempre se eu não contasse a verdade", disse.

Nancy Caron, porta-voz do departamento de Cidadania e Imigração do Canadá, disse que não podia comentar um caso específico, mas esclareceu que uma pessoa que toca num show, mesmo que seja por um cachê pequeno, pode precisar de autorização de trabalho.

Aaron Caplan, vice-presidente da Perry International, que ajuda viajantes a obter vistos, disse que alguns países submetem viajantes a exames mais cuidadosos para averiguar se precisam de autorização de trabalho.

"No caso do Brasil, se você vai fazer uma viagem de curto prazo, mas vai trabalhar, mesmo que seja para uma empresa dos EUA, há um visto separado", disse Caplan.

Outra questão que pode criar problemas para viajantes é uma ficha criminal.

Caplan diz que o Canadá é o país que mais surpreendeu visitantes considerados "criminalmente inadmissíveis" devido a uma prisão ou condenação anterior.

"Com a tecnologia, ficou mais fácil averiguar tudo isso", ele disse.

PREFEITO BARRADO

Estados Unidos e Canadá compartilham dados de fichas criminais, de modo que os agentes de fronteira canadenses podem visualizar fichas do banco de dados do FBI e o Canadá compartilha seus registros criminais com os Estados Unidos.

Os viajantes podem ser impedidos de ingressar no Canadá se tiverem cometido um de uma lista grande de crimes, incluindo furto, agressão, condução perigosa, condução de veículo sob a influência de drogas ou álcool e posse de uma substância controlada.

A aplicação dessas normas tem provocado dúvidas quanto a se uma acusação antiga de furto em loja ou de dirigir sob o efeito de álcool pode impedir uma pessoa de viajar, mas Caron disse em e-mail que nem sempre é possível descobrir de antemão.

"Não existe nenhum mecanismo específico que permita a uma pessoa saber com antecedência se será ou não autorizada a entrar no país", ela escreveu.

Para os estrangeiros interessados em visitar os Estados Unidos, ter ficha criminal –ou o simples fato de terem admitido publicamente que cometeram uma atividade ilegal– pode ser um impedimento à entrada.
Na primavera deste ano, a chef britânica Nigella Lawson foi impedida de entrar no país depois de revelar, durante um julgamento em tribunal, que tinha consumido cocaína.

E nesta semana, o prefeito de Toronto, Rob Ford, que tinha dito que buscaria tratamento para a dependência de álcool, voltou de avião ao Canadá sem ingressar oficialmente nos EUA, pelo aeroporto de Chicago.

Tradução de CLARA ALLAIN


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