Folha de S. Paulo


EUA mandam tirar do ar manual para imprimir arma em 3D

O governo dos EUA impediu uma companhia sediada no Estado do Texas de distribuir on-line os detalhes de como produzir uma arma de fogo de plástico usando uma impressora 3D.

A proibição, imposta pelo Departamento de Estado americano sob a alegação de que o projeto violaria as leis internacionais de controle de armas, surge apenas alguns dias depois do primeiro teste de disparo bem sucedido com uma do tipo.

A Defense Distributed, a empresa que produziu o protótipo, anunciou no Twitter que os desenhos do projeto haviam sido removidos a pedido do governo.

A companhia é dirigida por Cody Wilson, 25, aluno de direito na Universidade do Texas, que disse que a ideia de distribuir abertamente via Internet detalhes de como produzir armas foi inspirada por escritos anarquistas do século 19. Wilson argumenta que todos deveriam ter acesso a armas.

Um porta-voz do Departamento de Estado afirmou que "embora não comentemos sobre possíveis casos de fiscalização que tenhamos em curso, podemos confirmar que o departamento manteve comunicação com a companhia".

A ação surgiu tarde demais para prevenir a distribuição generalizada dos arquivos. A Defense Distributed informou à revista "Forbes" que os arquivos já haviam sido baixados mais de 100 mil vezes, nos dois dias em que estiveram disponíveis. O maior número de downloads aconteceu inicialmente de endereços online espanhóis, seguidos por endereços americanos, brasileiros, alemães e britânicos.

Das 16 peças que formam a arma, 15 podem ser impressas pela impressora 3D Stratasys Dimension SST, uma máquina de US$ 8.000 (R$ 16.200), segundo a "Forbes". A última peça é um prego simples, encontrável em qualquer loja de material de construção, para ser usado como pino de disparo.

O site Betabeat publicou uma cópia da carta supostamente enviada pelo Departamento de Estado a Wilson. O departamento afirmava que os desenhos para a arma precisavam ser removidos da rede porque podiam conter dados regulamentados pelo Departamento de Estado. O departamento informou que revisaria os arquivos.

"Eu obedeci imediatamente e retirei os arquivos", disse Wilson ao Betabeat. "Mas a questão é muito maior que as armas. Tem implicações para a liberdade da web."

A Defense Distributed não hospedava os arquivos nos Estados Unidos; em lugar disso, os havia subido para o site Mega, dirigido pelo empresário de Internet Kim Dotcom, na Nova Zelândia, no qual as informações sobre os usuários, que incluem a identidade dos visitantes ao site e de quem fez downloads dos arquivos, são protegidas por criptografia.

Os arquivos também foram subidos para o site de compartilhamento de arquivos Pirate Bay, onde provaram ser um download bastante procurado.

Os desenhos para a produção da arma são arquivos de projeto assistido por computador que podem ser lidos por software especializado e em seguida usados por impressoras industriais 3D para imprimir as finas camadas que formarão as peças, uma a uma.

Na quinta-feira (9), um especialista britânico em impressão 3D e um especialista em balística alertaram, separadamente, que uma arma construída com as peças poderia ser letal para o usuário, porque as questões físicas envolvidas no disparo de uma bala --com pressão superior a mil atmosferas e temperatura superior a 200 graus na câmara de disparo-- poderiam gerar fadiga catastrófica no plástico usado para a construção.

Mesmo assim, ao que se sabe dois jornais britânicos teriam solicitado que empresas de impressão 3D tentem produzir uma arma para eles.

Nos Estados Unidos, um repórter que baixou os arquivos constatou que as empresas com capacidade de impressão 3D suficiente para a tarefa se recusavam a produzir o aparelho, mencionando leis contra a produção desse tipo de arma --ou então solicitavam preços muito superiores aos de rifles de alta qualidade disponíveis nas lojas.

Wilson está tentando publicamente criar uma arma para impressão 3D desde setembro de 2012. No começo, tentou bancar o projeto usando o site de crowdfunding Indiegogo, mas sua proposta foi removida por violar as normas da companhia. Em seguida, ele levantou US$ 20 mil em bitcoins para o projeto, mas a Stratasys retirou por falta de pagamento a impressora que havia fornecido a ele.

Posteriormente, ele conseguiu acesso a uma segunda impressora Stratasys, presumivelmente usada para criar a arma disparada no final de semana, Wilson solicitou sem sucesso uma licença federal de armas ao Serviço de Álcool, Tabaco e Armas de Fogo do governo norte-americano, e declarou que desejava criar a arma legalmente. No domingo, o senador Charles Schumer, de Nova York, disse que era necessária uma lei que impeça as pessoas de produzirem armas em impressoras 3D.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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